FOME

Quando o ônibus entrou sacolejante no trecho esburacado da estrada de terra, a alça da bolsa de pano puído do senhor de olhos cansados não resistiu.

Rolou a garrafinha pet cheia de café frio.

Rolou a marmita, que bateu no pé de alguém e abriu.

Ficaram espalhados pelo chão o arroz e a pipoca.

As crianças riram. Alguns adultos, também.

A ex-professora, que seguia para um velório, não.

Chorou pelo morto ausente e pela falta de empatia presente.

Uma das estudantes fotografou, postou na rede social e legendou:

“Gente, alguém já viu pipoca de mistura? kkk.”

Não tinha a noção que surpreendente não era o tipo da mistura, mas a presença do arroz.

Paulo Sérgio PS
Enviado por Paulo Sérgio PS em 30/01/2024
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