A AVÓ E OS PÃES SECOS
Nos tempos difíceis da adolescência, quando a necessidade mais básica e de mais urgência, a fome, precisava ser satisfeita, Júnior todos os dias saía cedo de casa, um caderno debaixo do braço e um lápis no bolso, e se dirigia à casa de sua avó.
Em lá chegando, tomava a benção e ia para a sala, sentava no velho sofá e escrevia poesias que somente seu coração romântico entendia. Alguns minutos depois, munido também de caderno e lápis, chegava o primo João, pedia a benção da avó e fazia companhia a Júnior. E ambos confabulavam sobre as garotas e faziam poesias.
Mexendo nas panelas, cuidando da casa e aturdida em seus afazeres domésticos cotidianos, daí a pouco a vovó punha água na chaleira e atiçava o velho e bom fogão a lenha para preparar o café. Ela sabia o motivo da vinda dos netos todos os dias, e mesmo temerosa, ajeitava uma merendinha para eles.
Café pronto já fumegando nos copos de vidro, ela retirava das surradas bolsas de palha penduradas no armador um saco onde os pães dormidos moravam. Então, cautelosa, falando baixo, chamava Júnior e João: " meninos,venham tomar café, depressa, antes que Manoel chegue!" Manoel era o avô. Os dois poetas iniciantes, famintos e sonhadores, corriam sofregos e comiam seu pão com café antes que o avô viesse.
Eles nunca entenderam por que razão precisavam comer escondido do avô, nem qual o motivo de sua avó temer tanto que o marido encontrasse os próprios netos tomando café com os pães secos dormidos, saciando, ainda que momentaneamente a fome que os assolava.