Encontrou a porta aberta e entrou. Durante metade da celebração da Páscoa permaneceu deitado entre os dois últimos bancos do templo. De pelo amarelado e denso parecia um tapete. Não esboçava nenhum movimento, não latia, apenas respirava e dormia. A mulher que segurava o leque nas mãos, abanava-se velozmente, e balançava a cabeça, como sinal de negativa para a permanência daquele ser que parecia inofensivo. Olhou-se no espelho, retirado da bolsa de alça dourada, pegou o aparelho de celular com ponteira de corações e parecia contar os segundos para terminar a celebração, que para ela se tornou uma tortura. Até que uma ministra da Eucaristia despontou na porta traseira para organizar o ofertório. A mulher inquieta e afobada vai de encontro à leiga, pedindo que retire o animal da igreja, pois possui aversão ao bichano. Ao lado do banco onde o cão dormia havia uma criança que o observava calada. Vendo a movimentação da ministra para afastar o cão, a menina, de forma espontânea, ajoelha-se diante do cão e, cobre-o com os seus braços, dizendo:
- Deus também acolhe os animalzinhos. Pode perguntar pro São Francisco. Se você insistir, eu grito o padre.
- Insolente! Resmungou a dondoca, retirando-se da igreja com ar de superioridade.
A menina, sorrindo, soltou:
- Já vai tarde! - Olhando para o cãozinho falou: - Tá tudo bem, cachorrinho! Eu cuido de você. Pode dormir. Olhando pra mãe, sussurrou: - Mãeeee! Essa missa já está acabando? Vai que a bruxa do leque volta com a vassoura.