Mania

Eis a mania da vez. Já ruma, alegremente, a procurada rua onde fica a famigerada loja; fonte dos seus desejos atuais. Como explicar isso? Vai com um sorrisão de quem foi alcançado pela felicidade. Um ser efervescente em meio a almas plácidas - ou apáticas, para não insultar a sinceridade. Abre a portilha vidrosa e entra, esquecendo qualquer timidez, o espírito está tão cheio de vontade que esquece o resto. Nem a funcionária ousa impedir aquele assalto ocular. Pessoinha estúrdia, matuta, atrevida e maluca. Observa as prateleiras com um jeito de serpente faminta rodeando a presa inocente. A presa são saquinhos. É a mania da vez: chá. Pega um montão deles. Os que vêm com embalagem chique, decente, claro. Os que estão num sachê transparente e minguado são desprezados, mais vale a beleza antecipada, que deve embalar sabor tão bom quanto. Comprou quantos pôde (lê-se até onde os cinquenta reais permitiu), e partiu em sua volta serena à casa, balançando a sacola exposta como ouro mais puro de um vencedor invencível. Chegou em casa e espalhou o tesouro na mesa grande de mármore escuro, arrumou-os como prédios de cidade rica e tornou à observação.

"Qual devo tomar?"

Mania-maniosa, apesar de tudo, elegante. Fosse outra pessoa maníaca, talvez avançaria contra os chás e consumiria ainda crus, mas não, se dava ao luxo torturante de refletir qual tomaria. Pensou em escolher um só e só ir a outro quando acabasse. Assim fosse: acabaria o ano e não findaria os chás. Mas o subconsciente (o gênio), temendo a decisão do consciente (o idiota), já decretou logo o que seria feito: pegaria metade e prepararia já para tomar. Assim não correria o risco do dinheiro ter ido embora em vão, já que, mania por mania, poderia vir uma outra no seguinte dia e trazer esquecimento aos chás.

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ñ.r.

Rodrigo Hontojita
Enviado por Rodrigo Hontojita em 01/12/2021
Código do texto: T7398039
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