Cena pluvial
Não havia mais certo sinal de bom inverno do que os baixios cheios, o mato crescido, a chuva que adentrava a noite, mansa e constante. A parede da cozinha salpicava-se de insetos, de formigas que criavam asas e partiam para o mundo sem fim. No chão do terreiro, batido pela chuva, multiplicavam-se os sapos, brotando de todas as partes, pulando o batente, fartando-se com os besouros. Entoavam na calada da noite a velha canção ancestral dos cururus, prenúncio de fartura, do feijão garantido, do caixão de farinha cheio. Descalços, os meninos brincavam, catando os sapos com as mãos, em latas de querosene, e atolando os pés comidos de frieiras nas poças. Um grito da cozinha veio despertar os meninos do sonho anfíbio: a janta estava pronta. Ao redor da lamparina, os pequenos esperavam o bocado sagrado, enquanto a mulher amassava com os dedos a mistura de farinha e feijão verde, agradecida pela fartura.