Alice perdera a noção do tempo imaginando sua terceira história. O nome da personagem principal continuava em aberto quando ouviu uma mulher gritar na rua:

— Laura.

Parecia que a protagonista dera um jeito de dizer como se chamava. Mais tarde, naquela mesma noite, Alice teve um estranho sonho. Nele, Antonio usava uma longa capa preta e segurava uma cartola. Alice quis abraçá-lo, mas, num gesto brusco, ele a afastara. E antes de desaparecer, disse:

— Você esqueceu a magia.

Na manhã seguinte, Alice remoeu aquelas palavras. Lembrou-se do primeiro encontro com Antonio e a certeza de que o amor por aquele homem não se repetiria. No entanto, o medo de perder o controle reprimiu seu encantamento. Antonio tentara convencê-la de que valeria o risco, mas Alice era covarde demais para se entregar. Cansado, ele decidiu sair de sua vida.

Quando voltou a escrever seu terceiro conto, Alice sabia que o amor por Antonio estaria ali, mas trilharia um caminho diferente, graças a Laura. A personagem não perdia tempo. Se algo a interessava, seguia em sua direção. E com a mesma força que a impulsionara, virava a página. Arrependimentos? Apenas daquilo que não fizera. Em todas as vezes que quebrou a cara, não chorava por mais de dois dias. Depois disto, suas lágrimas não convenceriam nem a ela própria.

A terceira história de Alice seria o confronto com o avesso de sua alma. E a autora sentiria inveja da personagem que se entregara ao amor, sem temer nem pensar duas vezes. Laura não era apenas corajosa, mas sobretudo mais verdadeira do que ela. Quem dera, houvesse uma Laura dentro de Alice. E a personagem fosse o desejo sufocado lutando para respirar novamente. Talvez escrever pudesse resgatar a magia que Alice esquecera.

 

NOTA DA AUTORA:
 

ESTE CONTO FAZ PARTE DE UMA SÉRIE QUE COMEÇA COM O EPISÓDIO "A CASA DOS SUSSURROS". PARA MELHOR COMPREENSÃO DO ENREDO, LEIA A SEQUÊNCIA DOS CONTOS.