O HOMEM QUE NÃO TINHA SOMBRA
Ele não tinha sombra, de tão transparente que era. A única parte do corpo que a luz não atravessava direto era sua mão direita. Outra coisa que era só dele era que não sabia mentir. Também se mentisse estava na cara, todo mundo logo saberia, principalmente dona Edna, a esposa dele. Esta lia a vida dele como quem lê um livro. Dito assim parece uma coisa fantástica, mas o povo logo se acostumou, como se acostumou com a televisão e com tantas outras coisas fantásticas que existem por aí.
Tanta transparência, ás vezes causava efeitos incríveis, como quando ele andava em pleno sol e a sombra da mão dele – a única parte corpo que tinha sombra – formava uma figura indecifrável no chão. Parecia uma borboleta preta voando que o acompanhava por toda parte. Um dia o encontraram morto, deitado no chão sobre o próprio braço. Quando viraram o corpo, viram que ele tinha a mão fechada. Alguém forçou os dedos que já apresentavam a rigidez da morte e ao abri-la viu que na palma da mão estava escrito: “Eu te odeio, Edna!