SEDUTOR RESILIENTE
Credite-se ao excessivo pudor, a caprichos para evitar rubor à face ou tão somente à devoção à auto-estima. Certo é que a bela não se expõe. Dissimulada em meio a tecidos de seda rendada, oculta-se. Entretanto, lá, de cima, ela o espia.
Já, embaixo, tendo ao punho uma viola, ele reprisa a cena; agrade ou não, desistir nem cogita. Ali se põe toda tarde e, determinado, imposta voz e trejeitos de pretensa atração com o mote de cair nas graças e nos braços dela. Ao prenúncio da queda do manto noturno, ele dá por culminado mais um intento cotidiano; voltará amanhã. Nesse rito das horas vespertinas ele se crê capaz um dia de aceder o rosto e o amor de quem lhe é impar, ao menos no vagar de seus sonhos.
A sua vez, ao alto, ela não aquiesce, ainda; apenas o ouve. Mas, segue a espreitá-lo trás cortinas; talvez até suspire... Nada mais.