Liberdade
Naquela manhã fria e cinzenta de outono, entrei no claustro bem cedinho e apresentei-me ao oficial de dia. Passava a fazer parte do efetivo daquela tradicional instituição, como aluno interno e residente. Aos dez anos, nunca tinha tido contato com uma arma de guerra e naquele dia, senti um frio na barriga quando conheci a Sala de Armas. Rapidamente aprendi a montar e a desmontar a minha. Passava boa parte do dia a marchar e a fixar comandos de voz. As aulas eram distribuídas em dois longos turnos diários, divididos entre o programa de ensino escolar e atividades desportivas de carácter militar. Quando ia tomar banho, levava o meu saco com roupa limpa e deslocava-me sempre em marcha num pelotão de três fileiras. Tinha de bater os calcanhares e subir o braço à altura do ombro. Aos fins de semana podia ver a família se não estivesse castigado. Frequentemente aparecia em casa com a cabeça raspada e/ou com a cara marcada. Foram oito longos anos de disciplina rígida, muito trabalho e muito suor. Um belo dia, despertei desse pesadelo, ganhei asas e saí para abraçar a minha tão sonhada liberdade.