Como abraçar árvores
Ela aplaudia o pôr do sol, cultivava uma hortinha com plantas medicinais em casa, e na janela do quarto tinha um vaso com um girassol chamado Vincent. E agora ela tentava ensinar seu namorado a abraçar uma árvore.
- É sério. Você vai sentir algo incrível.
A energia vital ativada, a paz interior, a conexão com algo maior: sentiria tudo isso. Mas o rapaz estava cético; e um pouco desconfiado com o recém descoberto lado da namorada.
- Tipo, só abraçar?, confirmou ele.
- Isso, ela sorriu tranquila e confiante.
E ele abraçou a árvore. E abraçou porque aquele namoro, ainda com cheiro de livro novo, justificava esse tipo de bobagem.
Colou-se junto ao tronco. E desconfiou cada vez mais que nada fluiria dali, senão, talvez, uma alergia. E pior, sentia que algo se mexia entre ele e a árvore na altura do seu peito; imaginou uma grande e mal humorada aranha, que certamente teria opiniões bem próprias sobre isso de gente abraçando árvores.
Quanto tempo até sentir algo?, pensou ele. E mais importante: quanto tempo até eu poder fingir que senti algo? Julgou 15 segundos muito razoáveis, em especial porque foi o tempo que levou para inventar uma frase qualquer sobre sentir-se um com o Universo e tal.
Quando se afastou da árvore e ia emendar a frase, a garota se adiantou.
- Olha!, ela apontou, animada, o peito dele, onde uma lagarta marrom e enorme estava grudada.
O garoto estacou, sem saber se estapeava, dava um peteleco, ou tentava tirar a camiseta. Enquanto isso, a garota riu, se abaixou para pegar uma folha seca, e com um cuidado maternal transferiu a lagarta da camiseta para a folha. Depois, devolveu a lagarta ao tronco.
O rapaz olhava a garota fixamente, quase vazio, como quem perdesse algo ou encontrasse algo muito procurado. E viu, de repente, no fundo daqueles olhos, os reflexos de pores do sol, de camomilas e babosas num canto do quintal, de um girassol buscando o sol, de uma lagarta resgatada. E viu, inédita, a garota que o ensinava a abraçar árvores.
- E aí, sentiu algo?, perguntou ela.
Ele não conseguiria mentir.
- Sim, ele disse. Senti.