A Morte
Eram quase quatro da tarde. O expediente se encaminhava para sua última dupla de horas. O lanche vespertino já havia sido consumido. Restava ainda meia xícara de café, que já apresentava sinais de ter esfriado. Miguel se enrolara parado em frente à tela do computador a encarando, mas sem nada produzir. Pensava que ainda teria um bom tempo para fazer algo de útil para a sua empresa até a hora de ir embora. Mesmo assim nada de produtivo vinha a sua cabeça. Poderia abrir uma planilha de controle, atualizar alguns dados, mas mesmo uma tarefa bastante mecânica e sem muita exigência cognitiva lhe parecia por demais dificultosa naquele momento.
Ao contemplar a mediocridade cara a cara percebeu o quê sua existência tinha se tornado e pensou em sair do escritório correndo. Ouvia o trânsito fora das janelas. Ouvia pessoas e sons. Ouvia, de fato, a vida soprando para si. Quando pensou nessa palavra entrou em choque. A sua vida, não era mais propriamente uma vida. Era apenas um repetir monótono contínuo de hábitos automáticos e sem propósito.
Perguntou a si mesmo como não havia ainda percebido isso. Por que não tinha constatado que se tornara um robô em um mundo sem graça, frio e nublado. A dura realidade, quase que óbvia agora, tomou conta de seu corpo. Quando pensou em colocar as mãos na mesa para se levantar ela chegou.
A bela dama se aproximou. Ele sentiu sua presença sem precisar se virar para a entrada da sala repleta de estações de trabalho. Miguel sabia que ela entraria na dele, pois não estava ali por outra pessoa ou motivo se não vir lhe buscar.
Sentou na cadeira de aproximação em frente a sua mesa. – Boa tarde Miguel. Está na hora. Miguel por mais perplexo que estivesse, conseguia entender que não havia mais o que ser feito. Uma inesperada conformação caiu em sua mente. Porém antes, lhe restava o questionamento:
- Eu sei que preciso ir. Mas por favor, me esclareça porque somente segundos antes de você vir é que eu me dei conta de que estou vivendo de forma errada?
- Miguel, você já estava morto há muito tempo, apenas eu que me atrasei para vir lhe buscar. Respondeu a senhora Morte, com um leve sorriso cínico.