Espera

Quase perdi a estação. A leitura estava tão fascinante que mesmo dentro do metrô lotado, cheio de gente tagarela, vendedor ambulante e avisos sonoros, nada tirava a minha atenção daquele enredo tão bem escrito. Ainda era cedo, então resolvi parar no salão e dar uma arrumada no visual para o fim de semana. Estava com sorte, não havia ninguém na fila de espera. Quem me atendeu foi um rapaz jovem, se chamava Bruno. Muito simpático, perguntou se eu não queria deixar a bolsa e o livro em um dos assentos da fila de espera, o que de pronto assenti. Tudo permanecia em meu campo de visão através do espelho, o que me tranquilizou, já que sou muito apegada às minhas coisas.

Bruno sugeriu um corte especial. Ia combinar com meu rosto fino e era ótimo para o verão, que estava começando. Enquanto ia executando seu trabalho, contou sobre uma senhora louca que havia estado no salão pela manhã e feito um escarcéu sem qualquer motivo e saído sem pagar. Nunca imaginaria que uma dama tão bem arrumada, maquiada, cheia de colares e pulseiras poderia se comportar daquela maneira, ele disse baixinho em meu ouvido para as outras clientes não escutarem.

Acho que me distraí com a conversa pois não havia notado um rapaz entrar e se sentar bem ao lado de onde eu havia deixado minhas coisas. Fiquei atenta e comecei a imaginar a cena do rapaz roubando minha bolsa. Meu coração deu um pulo quando vi meu livro em suas mãos. Enquanto ele folheava as páginas, pensei em gritar, ou ao menos falar em um tom de voz alto e firme para que tirasse as mãos do meu livro! Não foi preciso. O rapaz repousou o livro novamente onde estava, cruzou os braços, depois cruzou também as pernas e pôs-se a esperar. Pura e inocente curiosidade dele, imaginei aliviada.

Continuei observando seus movimentos e percebi um ar desconfortável em seu semblante. Ele olhava para os lados. Se virou para trás. Olhou novamente para os meus pertences, agora com um olhar de desejo. Nesse momento eu tive certeza: ele ia roubar a minha bolsa! Mesmo assim meu corpo permaneceu imóvel, como alguém que tivesse sofrido um trauma grave na terceira vértebra cervical. Então, num movimento ágil, o rapaz saiu pela porta do salão.

Não levou a minha bolsa. Levou o livro.

Pela janela notei que ele não corria. Já estava com o livro aberto nas mãos, fascinado pela leitura. Soltei um riso meio abafado. Reação esquisita, como se tentasse esconder um sentimento misto de incredulidade e satisfação com o que acabara de acontecer.

- Do que você está rindo, Carla? - Bruno perguntou.

- Rindo? Não foi nada. Mas me diga uma coisa, Bruno. Você gosta de ler?