Sol enferrujado
O sol é memória. Fitou a dor inebriante passando pelo ar, ébrio sentiu uma ânsia, uma fome se regozijar em algum lugar. Retorcendo cada parte do seu corpo, sentiu o mundo o devorar, seu corpo diminuindo, como se tivesse se retraindo, tentando se esconder dentro de si. Olhou a noite perene, as estrelas desconexas e desnecessariamente mal organizadas. A cidade urgia. Não podia ouvir o murmúrio pequeno das estrelas. Desviou de pessoas, sentiu as coisas. As luzes fictícias de uma cidade caduca escureciam sua pouca sensatez. Perdia-se nas figuras, nos outdoors grandiloquente. Não sabia se as pessoas haviam se turvado ou era apenas seus olhos. Seus pensamentos se dobravam e se distanciavam, nessa maré de ideias ruins, pensar é só um detalhe. Era tão incipiente, pegava um cigarro moribundo e barato do bolso, com as mãos trêmulas tentava acender o cigarro. Não sabia como, mas percebia suas mãos arraigadas de cinzas e queimaduras. Tragou um pouco de morte para não se lembrar de nomes que, como doenças o invadiam. Queria tanto, sem saber, se desgraçar ao lado dela. Talvez os problemas venham da minha perdição e loucura, de estar procurando por você e não por mim. Tentou fumar tragar a fumaça incolor, queimar as pontas entre ele e o mundo, mas era tão pouca coisa. Era estranho. Sentia uma dormência quase incipiente e persistente tomar-lhe conta, um amensalismo histérico e desordenado, não sabe de onde e nem porquê vem, talvez seja ele mesmo, fugindo ou saindo de si. Ao olhar para o céu, resolveu perseguir as estrelas, nessa cidade insossa. Sentindo a noite bailar entre as penumbras, as vielas e becos. A noite rogar-lhe o nome, pedindo para adentrar. Sentia-se impregnado de noites e luares, lembranças e sentimentos precoces de impulsividade e ansiedade. Não sabia a razão. Carros passaram, gatos miaram, o silêncio decrépito soava tão apavorante. O sal indicia em seu rosto, fechou os olhos, tentando aquietar seus enevoados pensamentos. Eu quero, eu quero.