UM CIGARRO E NADA MAIS
Ele se refugiou num café para o café e se perguntou sobre o futuro e o que restava a fazer para que, enfim, pudesse se sentir feliz. Ruminou sobre esse tópico, enquanto adoçava o café com a minúscula colherinha que dava voltas na borda da xícara. Olhava a sua volta, todas as mesas ocupadas por casais, tudo tão harmoniosamente arrumado; estranhava que estivesse ainda ali, estragando a perfeição do lugar. Um homem de meia idade, bem apessoado, culto, elegante, bem educado. Sozinho. A família punha-se a falar as escondidas de sua masculinidade. Ouvia rumores atrás das portas sobre suas preferências. Os vizinhos trocavam confidências; os amigos desdenhavam. Ajeitou-se meio de lado, pernas despojadamente cruzadas. Tirou o maço do bolso do terno, deu aquela batidinha habitual na ponta da mesa, fazendo soltar-se um cigarro. O isqueiro em prata reluzia em sua mão; gostava do contraste pele, prata e chama. Tragou longamente e segurou a fumaça enquanto olhava as pessoas caminhando pela rua. Viu a moça que vinha num doce balanço a caminho do bar. Um pássaro pousado na ponta fina de um galho. A água da chuva encurralada pelo montinho de folhas secas no meio do caminho. O céu nublado, o bate-papo ao lado, a fumaça do cigarro e nada mais. Sentiu-se em paz.
P.S.: Encontrei-me com uma amiga de uma vida inteira com uma pausa no meio. E é surpreendente como, às vezes, parece que o tempo parou e continuamos do ponto onde estávamos.
Muito bom lhe reencontrar, Sandrinha!