ACONTECEU NAQUELA TARDE
 


Inspirada por uma cena daquele filme antigo — qual era mesmo o título? —, ela decidira experimentar o sabor da própria companhia. No meio da tarde ensolarada sentou-se num banco do parque, à beira do lago. Abriu um pequeno pacote de balas enquanto observava o brilho dourado na superfície da água.  O leve toque da brisa acariciou seu rosto. Ávida por um instante longe das preocupações, Laura respirou fundo, fechando os olhos. Num lampejo de tranquilidade, as sobrancelhas não estavam mais franzidas.

 — Este banco é meu.

Assustada, e sem entender o que o homem postado a sua frente dissera, ela não conseguiu evitar um grito desafinado que soou patético. Henrique acomodou-se ao lado de Laura, e sorriu, antes de explicar — com uma calma budista — o que ele quisera dizer. Nos últimos seis meses escolhera aquele banco para fugir dos clientes insuportáveis de seu escritório. Apesar do grande movimento no parque, durante todos os dias em que se refugiou perto do lago, não encontrara ninguém sentado ali.

Diante da tolice que acabara de ouvir, Laura trocou o susto pela irritação. Tantos parques e bancos naquela cidade, e ela escolhera o lugar reservado por um maluco com preguiça de trabalhar. Impaciente, resolveu ir embora.

— Eu já estava de saída.

— Não. Por favor, fique.

Num impulso, Henrique segurou o braço de Laura. A pressão de seus dedos era firme e, ao mesmo tempo, suave. Se aquele gesto não tivesse sido tão preciso, ela nunca teria ficado. Muitos anos depois do primeiro encontro casual, Laura ainda achava estranho admitir a verdade: a história entre os dois começara apenas por ele saber exatamente como tocá-la. 




 
(*) IMAGEM: Google
 
Dolce Vita
Enviado por Dolce Vita em 21/03/2016
Reeditado em 21/03/2016
Código do texto: T5580591
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