O MENINO PEIXE

DA SÉRIE CONTOS CURTOS

CONTO N° 9

O MENINO PEIXE

O Navio Hospital já navegava no alto Juruá, rumo a Carauari/AC, quando foi percebida a sinalização de ribeirinhos na margem esquerda. O comandante ordenou para que o navio atracasse no barranco da pequena localidade de cinco ou seis taperas de madeira.

Aproximou-se um homem de meia idade mas que aparentava uns noventa anos. Queria mostrar o filho caçula de sete anos com uma doença rara e desconhecida que o impedia de andar. Tinha o corpo totalmente coberto de escamas fétidas e oleosas.

Além dos pais, era muito querido pelos treze irmãos e a comunidade. Se comunicava através de grunhidos guturais.

Depois de ser examinado pelo pediatra da embarcação, foi decidido que seria transportado, junto com a mãe, para tratamento especializado em Manaus. A despedida dos entes queridos aconteceu com extrema emoção. Queriam que ele ficasse mesmo daquele jeito.

Durante a viagem, a medicação, os cuidados básicos e o amor da tripulação conferiam rápida regressão da doença, mostrando a recuperação epidérmica em alguns dias.

Após um mês navegando, foi encaminhado para o Hospital Universitário de Manaus, sendo recebido pelo chefe da dermatologia, sujeito arrogante que dizia já saber o diagnóstico - ¨Pênfigo forma eritrodérmica¨. Já tinha experiência com outros casos. O menino peixe, como era carinhosamente chamado, foi internado e depois de muito chorar, se despediu do pediatra militar, que prometeu retornar para levá-lo de volta pra casa.

Passados quarenta dias, o pediatra, cumprindo a promessa, procurou em vão o menino peixe. Segundo informações, o dermatologista quadruplicou a dose do corticóide que vinha sendo paulatinamente reduzida no navio, sendo esta a provável ¨causa mortis¨.

Marco Antônio Abreu Florentino