A laranja
Sempre ouvia em silêncio os insultos da mulher, do patrão, as insinuações maldosas dos amigos e a falta de respeito dos filhos. Não era homem de orações, abandonou-as havia algum tempo, nunca foi a um psicólogo mas certa vez em casa, a noite, foi a sacada do apartamento armado de uma lâmina e esfaqueou impiedoso uma laranja com brutalidade imprópria. Somente a lua minguante, olhar maldoso cravado no rosto escuro da madrugada foi testemunha de seu crime. Jogou a fruta dilacerada na rua e assistiu ela se espatifar na calçada com expressão cruel. Bocejou e não necessitou de benzodiazepínicos para encontrar o sono na cama.