Filosofia Infantil

Eu o observava pacientemente. O andar pausado, passos trocados a esmo. Em sua face reconhecia a indiferença. Questionava-me se, em sua cabeça, perguntas como: “o que fazem aqui?”, “o que querem de mim?” ou “qual é a graça?” o bombardeava. Nunca saberei.

Distraio-me...

Ao retornar, vejo que encarava-me. São olhos profundos, sinceros. Há algo que querem me dizer. Não! Parecem su-pli-car “ei, me tire daqui”. Instantaneamente, tenho dificuldade em enxergá-lo com clareza. Uma espessa lágrima escorre de meu olho direito. Ninguém nota. Gostaria de dizer-lhe que está tudo bem, que poderei ajudá-lo, tirá-lo dali. Mas sou apenas uma criança.

Distraio-me novamente. Agora, observo as pessoas e, principalmente, os adultos ao meu redor. Todos sorriem. Alguns o apontam aos seus filhos e dizem coisas a seu respeito. Muitas inverdades. Não compreendo. A injustiça é, pois, o que me destrói.

A alguns metros, ouço a voz grave de meu pai, chamando-me. Não quero ir. Não quero abandoná-lo aqui para tornar-se apenas mais uma atração. Não quero que as pessoas sejam indiferentes a ele. Agarro-me ao muro de proteção. As pontas de meus dedos tornam-se brancas. Vejo que, novamente, ele me observa. E poderia jurar que seus olhos estão marejados.

Meu pai não compreende minha insatisfação. Caminha a passos pesados em minha direção. Conto-lhe o problema e, para ele, sou uma criança que se preocupa demais com os problemas de adultos. A ironia foi que não percebi nenhum adulto se importando com esse problema.

Sou, pois, levemente arrastado pelo meu pai. Não paro de olhar para trás, acenando sutilmente para ele. Gostaria de regatá-lo do ser humano, entregá-lo a si mesmo. Mas o que uma criança, arrastada pelo pai, pode fazer? Não é justo. Assim como não é justo que eu tenha de ver um leão em uma pequena jaula, morando a tantos mil quilômetros de distância de seu verdadeiro lar.

E depois dizem que, com o passar dos anos, as crianças amadurecem e se tornam adultos inteligentes.

Por Jéssica França
Enviado por Por Jéssica França em 24/03/2015
Reeditado em 25/03/2015
Código do texto: T5181357
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