revelação

Caminhava apressado. A pasta embaixo do braço trazia coisas do escritório. Nunca lhe passou pela cabeça, numa tarde quente de fevereiro, atravessando um semáforo da oratório próximo a Paes de Barros levar um tiro no braço. A situação inimaginável aconteceu um pouco depois do meio dia. Uma gritaria, uns se esconderam atrás dos carros, outros correram, pularam no chão. ignorava se era vingança (não conhecia ninguém na região) nenhuma questão, nenhuma dor, nada. Caiu no chão com o impacto do disparo, fez uma careta, sentiu um fogo atravessar-lhe o corpo e depois uma estranha calmaria, um deserto, um olho de furacão. Dizem que quando se esta na beira do último dos abismos é possível poder lembrar de coisas da infância: por acaso e empirismo, creditou veracidade a tese. Lembrou de algo muito remoto, infância, verão de 81, lembrou do nome de alguém cujo o rosto viu uma vez somente na vida e viu a mesma face se diluir num solvente de retorno a realidade. Sorriu olhando o sol enquanto as pessoas o cercavam desesperadas vendo o sangue interminável e desmistificado jorrando do seu corpo. Empalideceu de repente e desmaiou. Horas mais tarde acordava enfraquecido, suado e ofegante (o braço esquerdo doía muito agora) ladeado pela mãe e a mulher grávida chorando num quarto frio de hospital, um abrigo oportuno contra o mormaço (antes do desmaio havia não havia tantas nuvens) teve auta e no hospital lhe disseram que ele havia sido vitima de um tiroteio entre policiais e traficantes. Parou pensativo e depois de um silencio rompido aqui e ali por poucas frases, declarou que gostaria de conhecer o autor do disparo para agradecer sua visita ao passado. Disse as mulheres que tinha certeza que seria pai de um menino e ele teria de se chamar Jaime, era questão de dívida. elas se olharam provando a mesma estranheza e pediram a enfermeira se não seria possível aumentar a dose de morfina no soro. Aliviadas, agradeceram que ja fosse sexta feira.