Aqui na Terra – Versão Longa e bastante alterada

- Vagamente baseado em factos reais –

Algures num futuro próximo...

“The world is a fine place and worth the fighting for”

Ernest Hemingway

Chovia, naquele dia, chovia imenso da última vez que te olhei.

Chovia, tudo estava triste, tudo parecia demasiado triste, mas apesar da chuva tornar tudo mais lúgubre, apesar da chuva, daquele tipo de chuva não deixar passar a luz, a Terra continuava bela, sofrida mas bela, porque a chuva nunca é eterna, à chuva sucede sempre o sol e assim nada apaga a beleza da Terra, apesar da chuva a Terra continuava a ser um local que merecia que lutássemos por ele.

Um dia, quando a minha vida estava a começar, ouvi dizer que nunca se é jovem para sempre, que existe uma altura em que se começa a envelhecer, mas não é o tempo que o faz, são os acontecimentos que o determinam.

Lembro-me dessa altura, porque foi o dia em que te vi pela última vez, foi no tal dia de chuva.

Nesse dia pedi que me ouvisses sem responderes, e depois parti.

Não sei porquê, mas mais tarde decidi escrever o que te disse, algo de absurdo porque foram palavras tristes, porque as palavras de despedida, ou as últimas palavras tendem a serem tristes, mas no entanto achei-as belas, à imagem do mundo, magoavam, mas não deixavam de serem belas…

Agora, numa altura em que a vida começa de facto a acabar, encontrei essas palavras num papel envelhecido, perdido numa gaveta, recordando-as, revendo-as tão claramente como no dia em que tas disse, e que decidi rever, porque senti (mais uma vez) a tua falta e ao ver essas palavras de certa forma estou a olhar para Ti e realmente a Ver-te…porque se estes são os meus últimos momentos quero recordar alguém que me deu alguns dos meus melhores momentos…

"Amar não é olhar um para o outro, é olhar juntos na mesma direcção."

Antoine de Saint-Exupéry

Desde que te vi pela primeira vez que passámos a olharmos juntos, que aprendi que só havia esta forma de olhar.

Mesmo agora, em que nos esgotamos, continuamos a olhar juntos, se bem que é uma questão de pouco tempo para o nosso olhar divergir, é pois o tempo adequado de partir, porque nos deveremos recordar de dois olhares numa única direcção…

Meu Amor, foste das pessoas mais extraordinárias que já conheci, tens uma firmeza ternurenta no olhar e na tua actuação, és toda harmonia, graciosidade no estado puro.

Quando olho para os teus olhos vejo uma pessoa genuína, entusiasta, altruísta, capaz de se bater até ao fim pelo que acredita, mas de uma forma ética, limpa.

Quando olho para os teus olhos vejo a matéria-prima de que é feita a mais bonita poesia, aquela capaz de inspirar a alguém os mais belos poemas.

Quando olho para os teus olhos vejo uma pessoa de uma invulgar sensibilidade, tanta que até comove como essa sensibilidade é tocante, comovedora. Contagiante até…

Quando olho os teus olhos vejo uma pessoa generosa, imensamente generosa, de uma maneira que não sei explicar.

Quando olho para os teus olhos vejo a mulher que eu amo, o ser que mais amei e por isso senti-me honrado em teres sido a minha companheira, a minha camarada, a minha melhor amiga, o meu maior amor.

Mas quando olho para os teus olhos agora vejo sobretudo a mulher que eu não posso ter…

Extraordinária.

O adjectivo com que melhor te consigo definir…

Sabemos bem porque tenho que partir, sabemos bem que o que tínhamos era de tal ordem intenso que se tornou insustentável, tal como um certo tipo de Catedrais era demasiado grande para se sustentar, por força dessa mesmo grandiosidade começou a implodir, e por isso a altura é esta, para que quando pensarmos um no outro recordarmos coisas belas, e não as amargas, recordarmos o que tivemos e não o que deixámos de ter, recordarmos a Catedral no seu apogeu e não as suas ruínas…

Nunca mais voltaremos a estar um com o outro, nunca mais sentirei os teus braços, a tua pele, nunca mais voltaremos a olhar para o mesmo lugar juntos, e por isso te peço que não percas as tuas qualidades, não as percas senão terás perdido a tua essência…

Sê assim, mantêm-te assim…a tua beleza física aumenta proporcionalmente, pois se já és muito bela, com as qualidades que descrevi, Meu Deus serás das mais belas…

Mereces tudo o que de bom a vida tem e terá para te dar, e muito mais, mereces o céu, as estrelas e nunca menos do que isso…

Gosto de Ti, demasiado, por isso sei que não te posso dar aquilo que desejo que tenhas…

Não chores a minha partida, celebra o que fomos com o que tens de mais belo: o teu sorriso, ou pelo menos aquele sorriso que fazias cada vez que me vias e que cada vez fazes menos…

Não quero, não admito, que percas de vez o teu sorriso, por isso parto antes que tal aconteça…

Tudo vai ficar bem, porque tudo vai começar de novo, com outras pessoas, mas sim, é um recomeço que nos dará a alegria, a felicidade, a harmonia, a paz que nos começa a faltar…

Tudo vai ficar bem, tudo vai ficar melhor, acredita…

A minha vida foi engrandecida por te ter conhecido, sem Ti a minha vida teria sido infinitamente menos rica do que foi.

Nos momentos de dor mais profunda recorda isto, isto de teres feito um ser mais feliz do que ele alguma vez julgava ser possível.

Amo-te, nunca deixarei de amar, Aqui na Terra ou em qualquer outro lugar, amo-te hoje, amanhã e no dia depois de amanhã…

Vá continua…

O resto de que falta das nossas vidas vai ser certamente extraordinário…

E sobretudo recorda que pelo menos para alguém foste e serás sempre a Mais Bela entre as Belas”

E pus a tocar uma das nossas músicas favoritas

“Enquanto houver estrada pra andar

A gente vai continuar

Enquanto houver estrada pra andar

Enquanto houver ventos e mar

A gente não vai parar

Enquanto houver ventos e mar”

Antes de sair escrevi por cima da porta da rua uma frase de um dos filmes da minha adolescência e que, descobrimos mais tarde, ser uma frase de que ambos gostávamos ao ponto de fazer dela um dos lemas da nossa vida

“Carpe Diem. Seize the day. Make your lives extraordinary”

E sim, transformei a minha vida em algo extraordinário, procurei fazer tal, mas fica a sensação (porventura falsa…) que se tivéssemos ficado juntos essa vida teria sido ainda mais extraordinária, mas não podia arriscar destruir as nossas vidas…

Se mantiveste as qualidades que via em ti, sem dúvida que a tua vida foi também extraordinária e fico feliz a imaginar até que ponto o foi; a minha deixou de o ser, pois chegou o momento em que já não vejo mais estradas por onde andar, em que já não sinto o vento nem vejo o mar…

Miguel Patrício Gomes
Enviado por Miguel Patrício Gomes em 25/09/2014
Código do texto: T4975337
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