A PRISIONEIRA
Ainda na manhã de 26 de novembro de 2013
Abismada na linguagem das palavras que obscurecem ao invés de esclarecer; abismada nos silêncios que não dizem o que urgia que dissessem; abismada pela ausência já de quaisquer direitos de caminhar pelas ruas objetivas; em estado de prisão domiciliar sem direito a hora de banho de sol, embora não haja cometido crime nenhum de lesa-pátria nem outros de que se lembre, de diversa natureza, a condenada sem direito a apelação e sem saber da duração da sua pena, que a condenação lhe veio de tribunal semelhante ao de Kafka em seu livro, a personagem-de-si-mesma olha ao redor da página do livro já em branco e pergunta : "Petrarca... Camões... Dirceu (de Marília): FOI PARA ISSO? FOI PARA ISSO? FOI PARA ISSO?" E, também, a um quarto personagem de seu sangue: “FOI PARA ISSO?”
Nenhum jamais lhe responderá. Nenhum. Nenhum. Nenhum. Ela também, jamais saberá. Jamais saberá. Jamais saberá. Jamais conseguirá saber.
O sol tímido desta ainda manhã ilumina, suavemente, a página do livro, a página já em branco do livro. A condenada vê o sol pelo lado de fora da janela. O sol, tímido,mas, sol. Ainda bem que existe uma janela para a condenada. Ainda bem.