Um presente de grego

Era manhã quando foi surpreendido pelo soar da campainha, e mais ainda quando recebeu o telegrama. Isso ainda existia?! A mensagem, extensa para o tipo de comunicação, informava o recebimento de prêmio literário, e convidava também para sua recepção solene.

O escritor sorriu amargamente ao se levantar com a estreita fita de papel na mão, incomodado pelas incessantes dores nos pés, joelhos e coluna, que o faziam erguer lentamente. Tratava-se de prêmio afamado, consagrador. Escrevia desde a juventude sem nunca ter sido notado, tendo angariado certo reconhecimento apenas entre seus pares. Fora dos círculos literários, no entanto, ninguém o conhecia.

Consciente de seu próprio mérito, tinha almejado fama em outros tempos, menos por vaidade, mais por precisão, tendo vivido em incômoda pindaíba durante décadas, e se retirado para terminar seus dias, esquecido, em uma cidade do interior onde suas parcas rendas lhe garantiam, ao menos, casa e alimento. Agora, no entanto, de que lhe valeria a glória recebida? Para torturá-lo com uma viagem incômoda e dolorosa, pensou com rancor. A ironia da situação o fêz soltar uma sonora gargalhada; tinha perdido tudo, exceto o humor. Percebia o absurdo da situação, o galardão tão esperado outrora, lhe seria agora inútil, verdadeiro estorvo, de fato.

Animado pela risada, considerou a hipótese de ir receber o prêmio; a piada só teria graça se se dispusesse a recebê-lo.