A LUA E O MENDIGO

Era um começo de noite dessas qualquer e o sol já se recolhia, os passarinhos já se recolhiam e todas as coisas que costumam ser da luz do dia foram procurar seu lugar de repouso e descanso. Só aquele homem sujo, vestido da cor dos andrajos que a vida lhe designou, decidiu ficar por ali. E olha que já fazia muito tempo que ele era do dia, e da luz do sol e de tudo o que há nessas horas de luminosidade em que parece que a vida é mais vida que em outras horas, mesmo a gente sabendo que não é bem assim. E foi naquele final de dia, onde o sol já se guardara de velho e toda a passarinhada tinha ido dormir, e tudo o que se dizia que fosse do dia tinha já se acocorado pra dormir, e só o mendigo velho e andrajoso persistia em ficar desperto, que veio uma lua bem lua mesmo, dessas grandonas de encher o céu. E foi se enluarando e se enluarando, com muita claridade e muita brancura, e foi se enchendo e se fazendo maior, tão bestamente e sem prestar atenção em nada, que ficou no céu todinha, a clarear o mendigo errante, que ainda insistia em revirar os sacos de lixo sem saber que o sol tinha ido embora.

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Publicado na "Antologia Paulista - Vol.VI" - Rumo Editorial - São Paulo - 2007

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