ZUMBIDO

Há algum tempo, descobri algo que para mim foi devastador... eu tinha um zumbido no ouvido. Nunca havia percebido, mas um som agudo e constante me acompanhava noite e dia, torturando meus pensamentos, um inimigo, que de imperceptível passou a insuportável. E depois que dei conta de sua existência pareceu tomar vida e tornar-se cada vez mais alto e incômodo, me privando do que considero essencial na vida... o silêncio.

Fui me tornando cada vez mais obsecada pelo som, ao ponto de não conseguir me concentrar, não conseguir dormir, não conseguir viver. resolvi, em um esforço inútil, encontrar a cura para o tal barulho que me atormentava. Fui a vários médicos, tomei coquetéis de comprimidos, rezei pra todos os santos, fiz todas as simpatias e amaldiçoei todos os deuses por de nada adiantar meus empenhos, então parti para o segundo plano... tentar amenizar o incômodo.

Foi então que perdi de vez meu tão desejado silêncio, pois na tentativa de não ouvir o tal zumbido, passei a procurar todos os sons da minha casa... TV, rádio, lavadora, secador de cabelo e por aí vai. Ligava tudo ao mesmo tempo e tentava fingir que o zumbido tinha simplesmente desaparecido. Até dormia com a TV ligada... mas de nada adiantou, o som podia até estar camuflado, ainda assim, eu sabia que ele estava lá, e não podia ter a paz que tanto almejava, pois não tinha meu precioso silêncio, portanto não conseguia me concentrar. Foi aí que parti para o terceiro plano...

“Caminhava às pressas sob a chuva fina e fria, as gotas minúsculas escorriam pelo meu rosto como lágrimas involuntárias e no fundo da minha alma sabia que tudo aquilo faria sentido. Mais alguns passos e veria a fachada... e lá estava a porta de vidro entreaberta convidando- me a adentrar, e sem hesitar o fiz. Molhava o piso seco com as vestes ensopadas e em seus olhos claros pude enxergar o temor. Reconheceu-me. Mais rápido do que pude raciocinar retirei do bolso o presente que lhe trouxe... um velho 38 já marcado pelos sinais do tempo. Puxei o gatilho da arma carregada e senti um pequeno tranco... o tambor girou e mais um tranco quase imperceptível - realmente tudo que sabemos sobre armas é lenda. Cheiro de pólvora e um fio de fumaça saiam do cano da arma em punho enquanto meus olhos brilhavam.

Na parede, ainda a pouco, reluzente em sua brancura, sangue humano, grosso e vermelho intenso, formava desenhos disformes e perturbadores, antes mesmo, de os projéteis caírem tilintando no chão... uma obra de arte diante dos meus olhos, incrustada em minha memória, tão forte e intensamente que nem o tempo poderá apagar”

A imaginação...

Depois dessa alguém se lembrou do zumbido?

Eu não.

Eliane Verica
Enviado por Eliane Verica em 23/04/2013
Reeditado em 17/08/2014
Código do texto: T4256012
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