O PASSAGEIRO

Mais um conto republicado, nada de sobrenatural, apenas um terror cotidiano.

Pelo reflexo da janela do ônibus vejo todos os dias rostos distintos, pessoas que vem e vão e ali se encontram, tantas mentes, tantos pensamentos e tantas histórias. Coisas que jamais saberei. Dentre essa magnitude de faces...

Pelo reflexo eu o vi pela primeira vez, seu olhar enigmático prendeu os meus, nunca ouvi sua voz, nem ao menos vi seu rosto sem ser pelo reflexo. Às vezes penso em olhar, mas logo mudo de ideia, é muito mais interessante guardar a magia de algo inconcreto.

Pelo reflexo às vezes nossos olhos se cruzam, mas não duram perplexos como em meus sonhos, não que eu me sinta atraída por seu tipo físico, nem tenho a intenção de conhecê-lo, apenas me conforto com o fato de poder imaginar enquanto me desloco.

Pelo reflexo começo a tornar-me obsessiva pelos milésimos de segundos que suas pupilas se encontram com as minhas, eu sei que a qualquer hora posso me virar e lhe perguntar algo, mas...

Pelo reflexo percebo algo estranho, um homem baixo aproxima-se. Assalto... ele reage. O ladrão tinha uma faca... O mundo parou, todas as pessoas presentes congelaram no tempo, algumas olhando atônitas outras fingindo que nada viam, o sangue, ainda morno, escorria pelo chão batido do ônibus até chegar aos meus pés..

Pelo reflexo eu vi uma poça vermelha formando-se a minha volta e enquanto todos fugiam, eu permaneci... presa no reflexo de uma vida desperdiçada... no vazio de um reflexo perdido.

Eliane Verica
Enviado por Eliane Verica em 14/04/2013
Reeditado em 17/08/2014
Código do texto: T4239654
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