Verão quase inverno

Sentara-se em sua cadeira, como fazia todas as tardes, já há alguns anos. Ela era sua melhor amiga, acolhia-a em seus recolhimentos melancólicos, em seu sono de todas as tardes, desde que fora morar naquela casa de repouso. Realmente era o que fazia, repousava. Repousava da vida que tinha tido, dos amigos que o tempo levara, da família que pouco a visitava... Repousava.

Era uma tarde de verão, mas um tanto quanto fria. Suas pernas haviam sido gentilmente cobertas por uma leve manta. O vento frio que soprava, ao invés de fazê-la tremer, como sempre, surpreendentemente aqueceu-lhe o corpo. Trouxe-lhe ecos de um passado distante e ao mesmo tempo ainda tão presente...

Sons de suas próprias gargalhadas de criança chegaram aos seus ouvidos. Alegres dias, aqueles, correndo pelos campos destemidamente com seus primos e amigos.

Sons de palavras elogiosas, sussurradas em seus ouvidos, provocadas pela insinuação de seus ombros perfeitos sob o casto vestido de outras épocas.

O riso de outras crianças que não o dela, mas do qual também partilhara, também se fez ouvir. O som e o mesmo carinho daquelas vozes, chamando-a...

Seu coração transbordou de calor e entusiasmo e, assim, naquela tarde fria de verão, adormeceu.