O fim
Aquele seria o fim de seu sofrimento? Ela queria acabar com tudo. Estava cansada de viver e, analisando bem, onde e quando ela havia realmente vivido? Nunca fizera o que a realizava, apenas o que se esperava dela. Julgava-se fraca, uma farsa, um fracasso. Sempre a boa filha, obediente, que os pais decidiam até o que devia estudar.
Estava farta de ser quem era, de sempre ter que corresponder a uma imagem de moça compreensiva, boa, que se sacrificava pelos outros. E ninguém entendia que ela tinha seus desejos, sonhos, vontades? Que era um indivíduo, não alguém cuja vida tinha que estar sempre ligada à dos outros? Ser boa não a ajudara em nada, só a fizera perder sua vida, sendo vista como um objeto, de quem só lembravam quando necessitavam.
Agora, andando à beira daquele precipício, ela pensava se devia acabar com a dor de não viver. "Que importa que eu morra? Nunca vivi e pessoa alguma lembrará de mim. Pensarão apenas na boazinha, que nunca deixava de ajudar, que fazia tudo pelos outros. Bem, tudo vai acabar. Serei livre."
Deu um passo à frente, imaginando que não iria cair, mas voar. Deixaria de ser o que a haviam forçado a ser e seria apenas ela, livre, com asas e podendo voar para onde quisesse. Cerrou os olhos, de onde saiam lágrimas e...
Abriu-os novamente, vendo um belo gavião que voava, as asas abertas. Extasiada, ficou a contemplá-lo, enquanto ele pairava no ar, belo e majestoso.Ele seguia sua natureza, nada podia impedi-lo de voar. E ela? O que a impedia de voar? Os outros? "Não, não são os outros que me impedem de voar, mas eu. O gavião segue sua natureza. Eu devo seguir a minha, abrir minhas asas."
Andou para trás, voltou para casa, rasgou a carta que escrevera e escreveu outra, mais longa. Depois, foi a seu quarto e fez as malas. Os seus pais teriam que entender e aceitar. "Bem, se eles não entenderem nem aceitarem, eu não retrocederei em minha decisão."
Antes de ir embora, deu uma última olhada em casa, sentindo-se como um pássaro que deixava uma jaula. Partiu, recusando-se a olhar para trás.