COLETÂNEA MINIMALISTA

TÁBUA DE PASSAR

Chegou a vez da camisa do marido. Aquela de colarinho engomado, no qual dias atrás encontrara marca de batom. Passou o ferro. Passou, passou... A raiva não passava.

*

OSTRA

Nosso desejo comicha na boca da noite.

O dia cospe nossos corpos: nudez perolada.

*

O ELEITOR

- Vendo o meu voto.

E o candidato:

- Comprado.

Mete a mão no bolso e tira uma moeda.

- Toma.

O eleitor olha o metal, incrédulo.

- O quê? 1 real! Só isso?!

- E se dê por satisfeito. Seu voto vale mais que você.

*

E LA NAVE VA

Do amor, aportou há algum tempo.

Agora, distante, olha o seu casamento afundar.

*

De tudo cada mês tem um pouco:

não é só em agosto que tem cachorro louco.

*

CLICHÊ ETÍLICO

Aqui estou eu,

neste bar, sozinho.

Na mesa, contemplo

o pequeno copo de vinho.

O poeta a solidão a noite o álcool

- que triste lugar-comum.

De um só gole bebo o copo

e ao garçom peço mais um.

*

PESADO

A poesia é um galho tênue que suporta apenas o pouso das nossas sensações.

Meu coração cansado, adejando em volta...

*

Afinal, o que são poemas? São janelas que se abrem no corredor escuro do nosso entendimento.

* * *