PRIMEIRA VISTA
Tudo começou com um olhar e aquela sensação de estar fora da realidade. Os corações bateram ao mesmo ritmo – do amor à primeira vista. Carmen e Adonias conheceram-se num ponto. Num dia frio com chuva. Bendito ônibus que passou numa poça d’água. Adonias – solícito – pôs o guarda-chuva à sua frente. E no agradecimento faíscas cintilaram de seus olhares. Nunca mais se separaram. Solteiros, jovens – ambos com dezoito anos –, universitários – Administração e Secretariado. Ambos classe média – o pai de Adonias Alfaiate e mãe costureira; o de Carmen gerente de um supermercado e mãe pedagoga. Formaram-se. Casaram-se dois anos depois. Lua de mel em Porto de Galinhas. Casa própria, cinco anos depois. Primeira gravidez sofrera um aborto espontâneo. Após três anos do acorrido vieram gêmeos. A cada dia, cada ano, amavam-se demais. Não havia um enjoo, um cansaço. A conversa não enfastiava. Os passeios, os almoços em restaurantes. Era um casal sue genes. Muitos os invejavam. Mulheres desejavam esse marido. Homens cobiçavam essa mulher. As brigas – quando haviam – terminavam em gargalhadas. Você é minha alma gêmea, um dizia. Eu nunca acreditei em amor a primeira vista, o outro respondia. Os anos se passaram. Vieram as bodas. Então – depois de cinquenta e seis anos de casamento – Adonias passa mal a caminho de casa, desmaia – batendo a cabeça numa guia – falecendo dois dias depois. Após uma semana do funeral, Carmen morre dormindo.
21/O8/2O11