Dêem-me Uma Noção de Realidade…- Versão Prosa...

I

Num mundo que virá depois de nós, dos nossos…

Algures no Espaço, um homem ama à distância porque a Terra, as pessoas, enfiam, a Humanidade, estão longe, demasiado longe…

O mais estúpido disto, é que a distância foi ditada pelo imperativo de salvar essa mesma espécie…: Uma espécie de batedor era necessário para explorar um novo planeta, potencialmente habitável por onde se deveria alojar parte da espécie, em crescente aumento, e necessitando urgentemente de novas terras…

A missão precisava de um toque humano, e por isso foi descartada a hipótese de se mandar um autómato…Era necessário sentir esse planeta, e por isso foi escolhida uma equipa de cosmonautas que deveria percorrer o espaço durante décadas e décadas, até chegar ao seu objectivo e regressar…

Por uma serie de imprevistos, ao fim de meia dúzia de anos a equipa de 10 pessoas ficou reduzida a apenas um mero elemento…

As mortes da tripulação foram imprevistas, e aparentemente sem explicação…Ao fim de intensivas análises chegou-se à conclusão que os falecimentos foram devidos à solidão do espaço profundo…Porque se descobriu que uma ligação permanente e continua com a Terra era necessária, e não apenas contactos técnicos algo esporádicos…

Em poucos meses teve que se improvisar, para salvar o que restava da Missão, mas sobretudo para salvar o seu último elemento…

E assim foi montado um sistema de comunicação permanente, com não apenas técnicos a comunicar com aquele homem só, mas também poetas, escritores, familiares, antigas amantes, antigas namoradas, enfim, tudo o que pudesse implicar o mais próximo de uma socialização humana, cuja falta tinha morto os outros astronautas…

E para surpresa e alívio de toda a gente, o improviso afinal acabou por resultar melhor do que anos de planeamento…

E assim, aquele homem foi envelhecendo, de alguma forma feliz, longe, mas ao mesmo tempo bem perto da sua Humanidade…

Há quem diga que a comunicação era Virtual, que com o tempo as pessoas que ele conhecia passaram a serem estranhas…

Há quem diga mais coisas…

Mas para Ele esse Virtual passava por ser a coisa mais Real que ele passou a ter até ao final dos seus dias…

Porque eram esses fios sem fios que o mantinham, que o mantiveram vivo, ligados a Humanidade muito mais do que se possa sentir ou imaginar…

Essa forma de comunicação passou a ter Toda Uma Enorme e insubstituível Importância…

Porque por muito belas que possam ser certas Estrelas, estas jamais possuíram o toque aveludado da voz ou de um rosto…Humano…

II

Outra vez, noutro futuro algo próximo…

A época dos grandes lançamentos literários em papel tinha acabado há muito…

O definhar da natureza, e a extinção de numerosas espécies de arvores fez com que o papel passasse a ser um bem raro, jamais destinado à literatura…

E assim a escrita passou a ter lugar num papel virtual, e os lançamentos na Grande Rede…

Claro que a tal democratização da Rede pensada nos seus primórdios não passava de um mito…

Havia canais de informação principais e secundários…

As pessoas bem relacionadas ou com conhecimentos apossaram-se da Rede Principal, os outros ficaram com os restos, com a rede secundária…

Um destes seres anónimos escreveu algo…potencialmente algo de bom, de excepcional, mas como a rede principal lhe está vedada, resta-lhe a outra, a marginal, onde a visibilidade do que quer que fosse era uma miragem…as mensagens, os livros eram lançados para lá, mas era raro alguém responder…ler tudo acabava por ser lido, mas uma real atenção era prestada à rede principal, onde Tudo Acontecia, onde Todo se passava…

Mas este homem sentia que tinha escrito algo que merecia ser lido…

E por isso arriscou, e lançou tal na rede marginal…

Esperou primeiro dias, depois longos meses, até que veio uma resposta.

Apenas Uma Resposta…

Mas pela intensidade desta, ele soube que valia por mil respostas, ele sentiu que essa pessoa realmente estava consigo…

III

De regresso ao presente…

A força da humanidade está na sua espantosa capacidade criativa, e de se adaptar à mudança

O tempo da socialização primária, cara a cara, pele na pele, sempre existirá, mas o tempo de novas formas de contacto chegou para não mais saírem do horizonte humano…

Não, não é absurdo chamarmos Amigo e Amiga a alguém que conhecemos na Grande Rede, ou com a qual comunicamos na Grande Rede…

Se os sentimentos forem cristalinos, se as intenções forem as melhores, se as máscaras forem reduzidas ao mínimo, é lícito e lógico chamarmos a essas pessoas de Amigas…

É um erro crasso social negarmos essa amizade…

Das melhores Amigas que jamais terei, tive-a na Grande Rede…e imensas pessoas de carne e osso bem perto jamais farão o que ela fez por mim…

Porque nos meus imensos defeitos, despi-me de certas defesas, de certos preconceitos e abri a mente ao Novo…e só ganhei com tal…

Porque Tudo

É Relativo

Tudo acaba por ser

Tremendamente subjectivo

Mas é Bem Real

Se perto ou longe

Te digo

Que gosto de Ti

Que Te quero comigo…

Dêem-me Uma Noção de Realidade…Mas Eu sei o que é Real…O que Existe, o que se Sente é Real…

Miguel Patrício Gomes
Enviado por Miguel Patrício Gomes em 18/05/2011
Código do texto: T2978772
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