O QUE OS OLHOS NÃO ENXERGAM
Aguiar passou em um concurso público, aprovado para uma das vagas reservadas a pessoas com deficiência. De acordo com as normas vigentes, ele, que é cego, precisa passar por um médico para que este ateste a sua deficiência. Assim, comparece à consulta no dia e hora marcado. Entra no consultório, a bengala branca em punho, os óculos escuros sobre os olhos. Ele rastreia o ambiente com a bengala, batendo vez ou outra em algum móvel.
O médico, um sujeito carrancudo usando um jaleco branco, sentado atrás de uma mesa, nem sequer levanta a cabeça para recebê-lo. Aguiar leva um momento para compreender o espaço. Encontra a cadeira, senta-se, a bengala posicionada de lado. O médico insiste em não lhe dá atenção, ainda cabisbaixo. Seus olhos estão fixos na tela de um computador. Sem mudar de posição, vendo a ficha de seu paciente na tela, ele fala:
- Vejo que o senhor está aqui para comprovação de sua deficiência para fins de posse em concurso público, correto? – Continua sem olhar para Aguiar.
- Isso mesmo, doutor, - Aguiar confirma.
- E qual a sua deficiência? – pergunta agora o médico. O cego responde:
- A minha deficiência é a visual. E o senhor, doutor, qual é a sua deficiência?
P.S. Caro(a) leitor(a), o conto acima é baseado em algo que ocorreu de fato com este que vos fala. Aproveito a oportunidade para agradecer a leitura. Valeu!