DIÁLOGOS ALÉM DO CUME
Capítulo I: Eu e o Outro:
Havia um velho sábio chamado ATARÁXOS que vivia no alto de uma montanha. Nada mais se sabia a respeito dele, a não ser que estava ali há muitíssimo tempo e que era um homem iluminado. Assim, várias pessoas desafiavam os perigos da montanha em busca de seus conselhos, os quais o filósofo, sempre generoso, distribuía com humilde satisfação. Um dia, um homem muito amargo e solitário procurou suas palavras.
- Ó, Grande ATARÁXOS, - disse o solitário, - sou um incompreendido. Não tenho verdadeiros amigos, e nem sequer consegui conservar minha família. Na juventude, talvez pela natural impulsividade da inexperiência, defendi minhas verdades de maneira tão ingênua quanto impositiva. Reconheço que, não raro, não distinguia a sinceridade da grosseria, e por isso machuquei pessoas que me amavam. Porém, percebendo isso, decidi mudar, e passei a suprimir meus posicionamentos em benefício da manutenção de minhas relações. Ó, mestre ATARÁXOS! Outra vez eu estava errado. Com o tempo, senti-me sufocado, e não demorou para que a melancolia me dominasse. Talvez num reflexo de desespero ou auto preservação, adotei a misantropia como saída. Convenci-me que o problema não era eu, mas os outros. Como pode ver, de nada adiantou, pois estou aqui. Diga-me, mestre, como devo proceder?
Antes de responder, ATARÁXOS encarou o visitante com um profundo e desinteressado amor. Sereno, começou a falar:
- Diga, viajante! É o barulho que nos faz desejar o silêncio, não é? – O homem assentiu com a cabeça.
- Ótimo! Pois da mesma forma, desconfio que sem o desconforto da contradição do outro, dificilmente poderíamos refletir sobre ele, sobre quem ele é, e por conseguinte, sobre quem somos nós mesmos. Nem tudo que é bom ou edificante é necessariamente fácil, embora seja indispensável, pois a bondade e a edificação justificam-se por si só. Sabei disto: O encontro com o outro também é um encontro comigo. A isso se chama alteridade. Quer viver bem com as pessoas, meu rapaz? – O visitante gesticulou que sim.
- Não espere delas mais do que elas possam lhe dar, - o sábio falou.
- Mas, mestre, como saberei disso?
ATARÁXOS sorriu.
- Ora, meu filho! Com a convivência.