A FEBRE

Quando a febre chegou à vila, ninguém prestou atenção. Estavam todos ocupados com a vida cotidiana, com os trabalhos, que eram muitos e urgentes. Nem mesmo quando o primeiro doente morreu houve qualquer alarme, era normal morrer, assim como viver: natural. Mas com o aparecimento de novos casos, começou certo alarde e, por parte de algumas pessoas, pânico. Os mais velhos foram os primeiros a adoecer e morrer, nenhum resistiu. A vila foi aos poucos ficando despovoada. Já era bem pequena, com uma quantidade mínima de moradores. Alguns, com a piora e aumento dos casos, foram saindo, indo embora, a procura de novos ares. Não sabiam que a febre estava espalhada por todos os lugares, ninguém estava a salvo. Saíram em busca de salvação, mas só encontraram morte e desespero. Os que ficaram não tiveram destino melhor. Ouvia-se por todos os lados lamentos e murmurações, choro de adultos e crianças, os que ainda encontravam forças para tais atos, porque a maioria sequer conseguia balbuciar uma palavra. Quem tentasse fugir, sair de casa em busca de alento, geralmente encontrava outros que, possuídos do mesmo desejo, fizeram também aquele trajeto. Cambaleantes e quase desfalecendo, esses poucos que se encontravam nas ruas, olhavam uns para os outros com tristeza e pena, pena do outro e de si mesmo, pois sabiam que estavam iguais ou piores, já no fim de seus dias, ou de suas horas. Alguém para lhes ajudar, era o que esperavam. Contudo, o tempo passava, mais pessoas morriam e nada acontecia de diferente. Mais ninguém tinha forças para trabalhar. Não havia quem cuidasse dos outros, pois o estado que todos se encontravam não permitia que algo pudesse ser feito. Alguns morriam de fraqueza, por não ter o que comer, pois ninguém mais cozinhava. Outros morriam por falta de medicamentos, pois ninguém mais era capaz de fazer um chá. Era o fim, os que ainda não haviam fenecido, pensavam. E era mesmo o fim. Em poucos dias, restavam três. Depois dois. Até que o último sobrevivente conseguiu forçar um pouco e olhou ao redor, vendo-se sozinho, por toda a extensão da rua, pensou amargamente em tudo, mas nada conseguiu ver com clareza, faltava-lhe entendimento, a linguagem estava obscurecida pela dor. Ele tinha algo a dizer, mas faltavam-lhe ouvintes. Ele suspirou e morreu, sem legado, sem nada.

João Barros
Enviado por João Barros em 11/01/2023
Código do texto: T7691999
Classificação de conteúdo: seguro