Peripécias de um funeral
Foi uma insuficiência respiratória. Morreu sozinho, no desespero de uma traqueia se fechando, a única portinhola de vida.
A noite da morte foi silenciosa, porque todos dormiam. Encontraram o corpo apenas no dia seguinte. Homem abastado, muito conhecido pelos empresários da cidade, era o braço forte da economia local. O velório seria realizado no município vizinho, porque o túmulo centenário da família o esperava.
Na capela mortuária, um mormaço angustiante acertava os carolas que cantavam as intermináveis e monótonas orações, dispersando pessoas que já bocejavam, torcendo para que os minutos acelerassem e o morto fosse plantado o mais rápido possível.
Deu-se a hora! Fecharam o caixão, mas quando tentaram movê-lo, rachou na base, expondo as pernas do defunto, revelando-as cobertas apenas pelas flores. Notou-se então a avareza na família. A vestimenta era deprimente. Apenas uma camisa envelhecida, furada por traças roedoras.
Com um atraso e muito cuidado para não desmontá-lo, o colocaram na perua funerária e o cortejo, enfim, seguiu acelerado. O transporte e assentamento ao túmulo foi também memorável e imprevisível. O caixão era longo o suficiente para uma gaveta curta. Então empurraram como puderam, mas foi inútil e o tampo não poderia ser fechado. Após uma troca de olhares desesperados, os funcionários resolveram cerrar a madeira macia de pinus. Diante da pequena platéia, encolheram os pés do finado e fizeram o trabalho, cimentando rapidamente a pedra de mármore para que a cena dramática não virasse comédia.