Voos livres
Do alto do apartamento podia-se ver todo o lado leste da cidade. E a mulher, todos os dias ao amanhecer, debruçava-se na sacada para observar os lindos voos dos urubus muito próximos, ora em círculos ora serpenteando. As aves pareciam pesadas e muito grandes, mas os movimentos eram suaves ao vento, e as penas negras brilhantes caíam sobre o chão do quarto.
Depois de uma tempestade na madrugada anterior, a mulher acordou assustada com o novo dia ensolarado entrando pelas janelas. Num ímpeto costumeiro e vicioso, caminhou até a vidraça, e ao abri-la, a luz intensa cegou-lhe por segundos. Com isso, pousou as mãos no pequeno parapeito da varanda para recuperar o equilíbrio, e foi quando a biqueira de um abutre chocou-se velozmente na cabeça, empurrando-a para um voo livre. Mas a ela faltaram-lhe as asas.