A candidatura do Sinhôzinho
O Sinhozinho, valendo-se de um atalho, saiu pelo fundo se seu quintal, atravessou um lote vago e veio bater à nossa porta. Era um meio de tarde, mais para calorosa. Trazia em mãos um envelope azul, e no coração, a esperança de candidato a vereador da cidade. Sem achar papai, ou mamãe em casa, confiou-nos o envelope aberto, sem explicitar se conteúdo, ou nos adiantar algum aspecto de sua plataforma política. Só recomendou que o entregássemos a quem de direito.
Corremos para dentro e lemos aquela insólita mensagem. De umas seis linhas datilografadas num papel branco, se tanto. Anunciava ao amigo eleitor sua candidatura e prometia trabalho. Papai, ao chegar, não se mostrou muito entusiasmado com aquele pleito. A campanha política caminhava para o seu auge e apelos à atenção do eleitor abundavam, nas mais variadas maneiras. Mas o interesse do votante não-engajado, dificilmente filtrava do nível de prefeito ao da edilidade.
As eleições vieram, logo sucedidas pelas apurações, com os votos contados de mão em mão, tabulados, e à população anunciados. Sinhozinho não passou no teste, não chegando sequer à marca de dois dígitos. E nem mais voltou ao nosso empoeirado beco-sem-saída.
Com poucos dias da proclamação dos eleitos, Sinhozinho achou seu caminho: sem edilidade, partiu para a eternidade. E foi singela a sua passagem: em meio a um banho de bacia, sentiu fortes dores e partiu para os estertores. Nem teve tempo de discutir o que precisava ser combatido, ou aplaudido. Ao piar das corujas vinha aquele sentir dolente: não teve mãos sujas.