O vinil
Miles Davis (a kind of blue), agulha de diamante e um vinil velho. Além da melodia lânguida do trompete havia os ruídos que lembravam qualquer coisa entre a chuva de inverno e óleo quente na frigideira. A música alimentava um fenômeno interessante. O semblante delicado de Graziela se desenhava através da neblina azulada de um cigarro barato por força das luzes oníricas de suas prazeirosas memórias, ouvindo blue in green pôde lembrar das curvas brancas e nuas da moça. Sem seu consentimento a atual esposa vendeu o disco para o sebo junto de outras pérolas de sua coleção, queria uns trocados e também jogar o passado fora em nome da atualidade. Pra compensar a sua tristeza deu de aniversário uma versão remasterizada do mesmo álbum numa edição importada para colecionadores com um mix de CD, DVD e um livro biográfico com páginas acetinadas. Nunca mais conseguiu lembrar do rosto de Graziela, nem se quer recordava se os olhos eram castanhos claros ou escuros e o CD não possuía o enigma dos ruídos nem a rotação baixava aleatóriamente tornando a música ímpar cada vez que a executasse. não suportando a crueldade daquele duplo homicídio doloso, separou-se da segunda esposa meses depois para honrar a nostalgia e a memória