SOFISMA
Perdeu-se na nuvem de poeira que os carros renovavam a cada acelerada. Do bolso da calça apanhou um chaveiro barato. Calculou que chegaria ainda a tempo de ver a procissão surgir no começo da rua onde morava. Era certo que estaria tossindo barro dos pulmões. E o cabelo desgrenhado, todo marrom, provocaria um olhar de repulsa de dona Marcelina, velha sebenta que insistia, mesmo naquela idade avançada, em carregar a imagem do santo. Falando mal de todo mundo pelos cantos depois é o que ela faria de melhor. Cuspiu mais barro. E viu crescer dentro de si mais ódio por aquela biltre. Apanharia um arco e flecha que trocara num rolo com um índio aculturado de beira de estrada poeirenta e ficaria postado às escondidas junto à janela, rezando para que a imagem do santo resistisse ao baque no chão de terra.