VERBO
As páginas vazias me assombram
e trazem sobre mim a ânsia de enxergá-las assim
exauridas de palavras
Natureza morta, síncope descompasso
Frases que ecoam
Gritam
Se desesperam num vácuo sem fim, nem começo
Ai de mim que esmoreço defronte esse espaço, enfim...
Cala-te!
As páginas tem ouvidos!
Não empenhes o teu tato
nem réu esforço aguerrido
Porque atrapalharia
Quebraria o equilíbrio desses enigmáticos fantasmas redarguidos
Espelho, espelho meu!
Diga-me: La-ti-fún-dio
Sem prolixo, sem gerúndio
Diga o que se perdeu
Diga tudo: Es-ta-pa-fúr-dio
Diga contrato, sem lucro
Um total eclipse da razão
sem sentido e sem noção
vejo o véu esvoaçar
branco-etéreo nuvem
Cirrus-stratus
não trás frio nem estrago
Num relance e afago as folhas voltam
Sinto o véu roçar minha face
Imagem feminina envolta em elegante traje vitoriano
O vento das frases a lhe moldar a face
A ordem empenha:
"Reage..."
"Escreve..."
A mão fria empunha a pena
E chega da dimensão dos poentes
e poemas inclementes
as palavras em relance repente
seu juízo e absolvição imponente
Viúvas de luto alvo
parede de cal
Mas não as sinto romper a realidade,
transitam seus vôos Indiferentes
Planam em transe mórbido e entorpecente
num mar calmo e sem palavras
Rompo esse limite e escrevo
Desvendo escassos segredos e a tal musa das eras já não é essencial pra mim
Então já não há mais vôo
É o vazio que é implodido num verbo antigo
Megalomaníaco e eterno
As folhas pairam na estação
enfáticas
estáticas
Em menção de moto eterno
E tudo o mais se faz inverno
Reticente
A palavra inexistente, trago-a a realidade
A palavra morta
decaída, falida, esvaída
trago-a de volta à vida.
23/05/2022
07:44hrs