O velho poeta e o poema renitente...
Pelos acessos das minhas veias
corre sangue dos velhos poetas...
Navegam na desgraça dos meus
desacertos os meus taciturnos
parceiros e vagantes das letras.
E, entre um braço e outro, um poema
que presta, e outro torto, que infesta!
Corre, também, por aqui,
um ranço de cama suja;
coisa de velho rabugento,
que tem horror a sabão e banho.
Pelos acessos das minhas veias
corre sangue dos velhos poetas
e um riacho de manhas e manias...
E, neste emaranhado de vias
Líquidas, se misturam os que se
adoravam e os que se odiavam.
De súbito, o poema toma a pena
das mãos hesitantes do velho
poeta; e, sai correndo a brincar
de pique-esconde e não volta jamais.
E, fica um velho a tremer
sem saber o que fazer com
a sombra do poema nas mãos...
Dentro dele ainda tem
partes bem conservadas do
poema mais venerado, que,
por rabugice não acaba de nascer.
Pelos acessos das minhas veias
corre sangue dos velhos poetas...
O sono tempera o sonho e no
horizonte da mente ele flerta
(em vão) com o seu poema mais renitente.
Lá ao longe, pela madrugada, ele acha
desgovernado o poema pelos becos...
Mas, quando, intimamente lhe dá as mãos,
sai cambaleante a zombar do pobre, o poema.
O homem, antes falante
e dominante das letras;
sabe que agora não passa
de um velho, já velho demais,
que perde o controle das rédeas
quando tenta domar as palavras...
E, sem medo ele percebe,
que vem chegando do além
um sono profundo que tem cheiro
de sepulcro e gosto de eternidade...
Ele sabe também que deu vida
a vocábulos antes mais
mortos que a própria morte!
Enfileirou uns aos outros,
reinventou outros tantos
e criou poesias e poemas...
Mesmo, que vez ou outra
alguns lhe escapam,
para brincar de pique-esconde
pelos vãos da mente cansada...
Pelos acessos das minhas veias
corre sangue dos velhos poetas!