Eu poeta
O talento que me foge as mãos,
De escrever o oculto da alma,
E impede-me de ser poeta,
Poetisa, escrivã,
A qual a denominação não convém
Se a falta do fervor escapa aos dedos.
Embora, no íntimo,
Secretamente exposto do meu ser,
Grita nas sobras de papéis
À sombra de versos sujos,
Vulgares e amadores…
Envergonho-me de ser tão vã,
De ter poesia tão pobre,
Entretanto, não sou poeta e nem o quero ser.
O dom de tocar sentimento, não me tem
E nem eu o tenho,
Este é dado aos melhores… mais sensatos,
Que corroem corações
E não são corroídos,
Que exploram os segredos alheios
E nunca são expostos,
Pois não possuem nenhum.
Nada que faz chorar, rir, gritar
Mas, só o que mantém a calmaria da alma.
Longe de mim ter tal equilíbrio,
Logo eu que sou chuva no verão,
Inconstante como o vento,
Que tenho inúmeros segredos,
Que escondo de todos,
Escondo de mim…
Logo eu que tenho ruídos,
Marcas, lágrimas e trapos corroídos.
O talento me falta ao escrever,
Falta ao tocar na fragilidade do meu eu,
Tão miúdo e perdido.
A poesia, por sua vez, se levanta artística,
Pronta para nos dar o bote
E eu já caí em suas armadilhas mil vezes.
O talento que me foge as mãos,
De escrever o oculto da alma,
Paira sobre mim,
Vedando a alma oculta que se atreve,
Apesar de tudo,
Se atreve nos seus suspiros de audácia,
Tentar rascunhar o reflexo
Da sutileza poeira
Que lhe é apresentado aos verdadeiros poetas.
No fim, não escrevo,
Mas a poesia se escreve só
Em mim, como uma marca,
Escreve sobre tanto e sobre nada
Mostra as cicatrizes deixadas da minha ousadia
Fingindo ser um eu poeta.