A PITONISA
                     Republicação - Poema escrito em 2004

  Ao meu amigo Facuri, que sempre me chama de pitonisa.


 
Poema publicado também em vários outros sites. Modestamente, creio ser este um bom poema, ainda que catártico; não é apenas e tão somente texto próprio de autoajuda; é um pouco mais do que isso: Linguagem; também gravado e postado no Áudio.


A cantora que não sou
espera-me no palco
vazio de instrumentos
vazio de partituras
vazio de microfones
vazio de músicos
vazio de estantes

cenário de Beckett.

Deixa-me dizer-te ao pé do ouvido
(para que o nosso outro ouvido, mallarmaico, não nos ouça):
A pós-modernidade, às vezes,
dói-me tão profundamente
em fundo tal da alma careca
que, por abissais sejam os seus poderes,
nenhum adepto de Jung alcançaria,
lá onde o meu inconsciente coletivo
esteja a dançar um funk da periferia.

"Cair-me-ia a cara se no baile
o funkeiro vis-à-vis
começasse a falar de Mallarmé".

Que me comece a cair a cara desde já
face à enorme probabilidade
da ocorrência efetiva do fato
mencionado de passagem e entre aspas
na estrofe anterior.

Eis que, repentina,
do mais fundo do fundo
do meu inconsciente coletivo
ergue-se a voz de Frida Khalo:

“Lembra do nervo do tendão da tua perna esquerda,
aquele atrofiado de nascença?
Nunca te houve tempo de rock
nem de quadra de samba.
Pela lógica do plano aqui embaixo
deveria, certamente,
haver à tua espera um baile funk,
porém,por mais que a vista force
me está sendo impossível vislumbrá-lo."

“Assim, ainda que consigas outorgar a teu self
outra espécie de dias transgressores,
cala para sempre a todo ouvido
teu destino malogrado de Madame Bovary.”