Alguns dizem!
(Reflexão a partir de: Isaías 50,5-9; Tiago 2,14-18; Marcos 8,27-35 )
Hoje somos convidados a mais um ato de fé. Mas um ato de fé duplamente comprometido: conosco e com aqueles que estão próximos de nós.
Como se dá isso?
A resposta nos vem do profeta Isaías, dirigindo-se a nós, hoje, numa exortação de ânimo: “Ao meu lado está quem me pode ajudar” (Is 50,8). Como num eco do profeta, o apóstolo Paulo, em uma de suas cartas exclama: “Se Deus é por nós, quem será contra nós? (Rm 8,31)”. Ambos afirmando a presença de Deus amparando nas dificuldades da vida.
Mas essas falas não ocorrem de forma isolada. Elas tem repercussão ao longo das páginas da Palavra Sagrada. Um eco dessa palavra repercute em Tiago que propõe, mediante uma indagação: “Meus irmãos, que adianta alguém dizer que tem fé, quando não a põe em prática?” (Tg 2,14).
E aqui está o “X” da questão. Notemos que o X ocorre porque duas linhas se cruzam. Seu centro é ponto de convergência e, ao mesmo tempo, ponto de partida.
A confiança no senhor, como aquele que ampara nas dificuldades, é reflexo de um ato de fé. Mas a fé tem que ser posta em prática! Portanto, vai em direção ao outro! Não se concebe um ato de fé, como algo isolado, alheio ao que ocorre com aqueles que estão ao nosso redor! Não existe ato de fé, quando o centro das nossas atenções somos nós mesmos! E, se ocorrer uma profissão de fé, sem que ela esteja voltada para as necessidades dos outros, será uma profissão falsa, interesseira, mentirosa. Pode ser tudo, menos uma profissão de fé cristã!
Por quê? Porque assim ensinou o Mestre. Porque assim agiu o Mestre. Porque essa foi a condição do Mestre…. E quem crê no Senhor tem que seguir seus passos: “Se alguém me quer seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga. Pois quem quiser salvar a sua vida, vai perdê-la; mas quem perder a sua vida por causa de mim e do Evangelho, vai salvá-la” (Mc 8,34-35). E aquele que se contrapõe ou tenta impedir esse projeto solidário, vale a palavra de Jesus: “Vai para longe de mim, Satanás! Tu não pensas como Deus, e sim como os homens” (Mc 8,33).
Portanto, não é exagero repetir: O projeto de Deus vai além do ato de fé, exteriorizado em palavras. Exige atitudes!
Atitudes que geram a gratidão pelo bem recebido e as perseguições por parte dos inimigos da Boa Nova. Essas atitudes podem gerar oposições como as enfrentadas pelo profeta. Nessa situação a resposta do agredido deve ser como a de Isaías: “Ofereci as costas para me baterem e as faces para me arrancarem a barba: não desviei o rosto de bofetões e cusparadas”. A resposta às agressões podem enfrentadas porque: “O Senhor Deus é meu Auxiliador, por isso não me deixei abater o ânimo, conservei o rosto impassível como pedra, porque sei que não sairei humilhado” (Is 50,6-7).
E isso nos leva de volta ao apóstolo Tiago. O apóstolo que, sob inspiração do Espírito de Deus, teve uma clareza cristalina ao afirmar a necessidade juntar aquilo que nunca esteve separado no plano do Senhor: A fé não se dissocia das ações. É repetitivo, mas a fé exige compromisso com o outro. Ensina o apóstolo: “Imaginai que um irmão ou uma irmã não têm o que vestir e que lhes falta a comida de cada dia; se então alguém de vós lhes disser: 'Ide em paz, aquecei-vos', e: 'Comei à vontade', sem lhes dar o necessário para o corpo, que adiantará isso? Assim também a fé: se não se traduz em obras, por si só está morta.” (Tg 2,15-17).
É claro que as circunstancias hoje são outras. A conjuntura é diferente. As estruturas sócio-econômicas são mais exigentes. Os problemas atuais são muito mais complexos…. Mas isso não invalida a orientação do Senhor. Não revoga a lei instituída desde o coração do Pai. Pelo contrário, torna o compromisso com as transformações das estruturas de pecado e de morte ainda mais exigentes. Exige maior comprometimento, pois as vítimas continuam sendo engolidas pela voracidade dos representantes do anticristo. Esse é o ambiente onde o cristão tem que afirmar: “eu te mostrarei a minha fé pelas obras!” (Tg 2,18).
Tudo isso nos leva à indagação de Jesus: “Quem dizem os homens que eu sou?” (Mc 8,27).
A resposta do cristão não pode ser como a daqueles mencionados por Pedro: “alguns dizem...”; “outros dizem...”. Os outros podem dizer isto ou aquilo, pois não estão comprometidos com a causa do Evangelho. Do cristão, é cobrada uma postura. É Jesus quem faz a cobrança: “E vós, quem dizeis que eu sou?” (Mc 8,28-29).
Hoje somos convidados a mais um ato de fé. Mas um ato de fé duplamente comprometido: conosco e com aqueles que estão próximos de nós. Não nos cabe ser como os outros: “alguns dizem!….” A nós é feita a pergunta de forma direta: Quem é Jesus para nós…?
Neri de Paula Carneiro
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