BIG
- Vamo, pai! Vai demora muito? resmungava impaciente meu guri que, feito eu, detesta provar roupa. Mas, pra bater, camiseta a R$ 15,00 até que não é ruim.
Big: mais do que nome, casa bem com o atentado ao vernáculo das camisetas, do McDonald e de tudo mais que achamos que fica melhor dito em inglês e que, não por acaso, tem muito em "shopping centers". Já imaginou se se chamasse "Grande", perguntariam alguns.
No labirinto de prateleiras, comprando camisetas (isso mesmo!) naquele 'super'mercado da 'Grande' Florianópolis, íamos eu, meu filho e meu sogro, um professor aposentado metido a filósofo e cada vez mais anti-consumo, mas que, mesmo assim, opinava, olhava, escolhia. Foi partícipe de nosso ato capitalista.
Gastamos a sola ali durante mais de uma hora. Depois da andança, com um punhado de regatas no carrinho de compra, nos dirigimos ao caixa. Eu, novato naquele local, um pouco perdido procurava me informar onde poderia 'acertar' o negócio.
- Vem aqui, eu sou aposentado, vamos pegar esta fila aqui, sussurra meu sogro apontando para uma fila preferencial.
Bom, arrazoei naquele instante, já que ele ajudou na compra, está na fila e também vai ajudar a pagar, não há inconveniente. De repente, quando olho à minha volta, meu sogro tinha sumido. Quando vejo, ele estava esperando já no outro lado do caixa, ao final. Droga! xingo eu em pensamento, começando a ficar desconcertado com outros acima de 60 que chegavam na fila depois de mim e só viam ali eu e meu "cheio de energia" filho. Então sinalizo com veemência para meu sogrão retornar para a fila, pois senão iriam achar que eu estava me aproveitando...
Mas não deu outra. Logo em seguidinha, na hora em que finalmente sou atendido, um dos aposentados, aparentemente esclarecido, sem entender a razão de eu estar ali, começa a criticar. E em alto e bom som!
Eu aponto para meu sogro e este retorna ligeirinho e retruca tentando justificar nossa presença naquela fila:
- Epa, eu é que vou pagar a conta!
Mas o aposentado, e não tiro sua razão, continua no ataque:
- Olha só a 'ceninha'. É… que do jeito que os fatos ocorreram, aparentou realmente que eu tava dando uma de gaiato.
E assim, um pequeno barraco se armou.
Meu sogro, já irritado com o chato, tenta responder a altura:
- Ah, se não quer se incomodar fica em casa. Vai dormir! O aposentado (como se meu sogro também não o fosse) continua. Fala das outras pessoas que estão sendo obrigadas a esperar. Fala que então vai trazer seu pai também pra pagar a conta antes etc. Provavelmente tem em mente a miríade de jovens que levam seus pais, avós e criancinhas de colo junto 'apenas para' passar na fila mais ligeiro. Este definitivamente não era o nosso caso, apesar de eu não negar que meu sogro bem podia ter esperado sentado e eu, então, ter enfrentado uma fila não preferencial.
Por fim também não me segurei. Perguntei ao indignado senhor:
- Quer dizer então que se eu tivesse um cadeirante comigo, ele também teria que esperar? (entenda-se: esperar enquanto eu esperasse em fila normal).
Nada contentava o sujeito que continuou a soltar impropérios.
De qualquer forma, o episódio foi daqueles bem desagradáveis.
Um capítulo de minha história que ficou entalado na goela. Não me deixou sossegado durante o resto da tarde.
Fiquei pensando em meu velho pai, portador de Mal de Parkinson. Dia desses levei-o para passear na nova Havan de minha cidade, que ainda não é big mas se até Havan já tem é porque vai chegar lá. Ele não fez compras. Nem pode: não tem mais condições. De qualquer forma, para ele que passa a maior parte dos dias sentado ou acamado, aquele passeio, de cadeira de rodas, foi revigorante, mas ao mesmo tempo cansativo, dadas suas condições. Será que, mesmo não sendo ele o pagador da conta, não teria, ainda assim, direito a que os que dele cuidam entrem na fila preferencial para que 'ele' não precise esperar? O atendimento preferencial se aplica somente àqueles que efetivamente estão de pé na fila ou também aos acompanhantes? Quem é o cliente, o que está na fila ou todos os que fazem a compra, consomem o produto e que se encontram no recinto no momento da compra? Ora, nem sempre um acompanhante está ali somente para receber atendimento privilegiado. Ele pode, como meu sogro, estar participando do corre-corre.
Tomemos o exemplo de uma família. Um casal, a mulher sendo gestante, e um menininho de 5 anos. Eles vão ao banco quitar a fatura de luz. A fila normal é enorme. A preferencial tem dois ou três na frente. A família andou durante a manhã inteira, a pé, comprando, pesquisando preços, pagando contas etc. São 11h30 da manhã. Todos estão cansados. Nos bancos, hoje em dia, geralmente há acentos. Assim, a mulher e o menino podem sentar e aguardar enquanto o pai entra na longa fila de espera. Mas... não teriam o direito eles de usufruir de atendimento prioritário também? Mesmo sentada, não tem esta mulher que carrega no seu ventre um novo e delicado ser tanto direito quanto qualquer aposentado que está em pé na fila? O tempo, mesmo admitindo que com mais conforto, passa mais ligeiro para os que estão sentados?
Comecei, então, a me questionar enquanto discípulo de Cristo. E só então percebi os diversos 'bigs' envolvidos: 1) minha big-estupidez de ensejar um falatório daqueles; 2) a mega-mancada do meu sogro em postar-se na fila preferencial e depois nos deixar nela, nós os jovens fortes e vigorosos que podemos esperar mais um pouquinho; 3) a hiper-grosseria do sujeito, que bem poderia ter tentado formas mais amenas de fazer sua queixa; 4) a ultra-lacuna de algumas leis que não especificam detalhes e dão margem a isso tudo; 5) e, por fim, a super-hiper-mega-ultra-sacanagem daqueles que se aproveitam, sim, e usam de qualquer artifício para ganhar tempo e que fazem, como sempre, os bons pagarem pelos maus.
Irônico. Dizem que o universo começou com o Big Bang e eu afirmo que só Deus, aquele que é maior do que tudo o que está no mundo, para ajeitar, ao cabo dos dias, essa história que nós homens tentamos complicar cada vez mais...
Big: mais do que nome, casa bem com o atentado ao vernáculo das camisetas, do McDonald e de tudo mais que achamos que fica melhor dito em inglês e que, não por acaso, tem muito em "shopping centers". Já imaginou se se chamasse "Grande", perguntariam alguns.
No labirinto de prateleiras, comprando camisetas (isso mesmo!) naquele 'super'mercado da 'Grande' Florianópolis, íamos eu, meu filho e meu sogro, um professor aposentado metido a filósofo e cada vez mais anti-consumo, mas que, mesmo assim, opinava, olhava, escolhia. Foi partícipe de nosso ato capitalista.
Gastamos a sola ali durante mais de uma hora. Depois da andança, com um punhado de regatas no carrinho de compra, nos dirigimos ao caixa. Eu, novato naquele local, um pouco perdido procurava me informar onde poderia 'acertar' o negócio.
- Vem aqui, eu sou aposentado, vamos pegar esta fila aqui, sussurra meu sogro apontando para uma fila preferencial.
Bom, arrazoei naquele instante, já que ele ajudou na compra, está na fila e também vai ajudar a pagar, não há inconveniente. De repente, quando olho à minha volta, meu sogro tinha sumido. Quando vejo, ele estava esperando já no outro lado do caixa, ao final. Droga! xingo eu em pensamento, começando a ficar desconcertado com outros acima de 60 que chegavam na fila depois de mim e só viam ali eu e meu "cheio de energia" filho. Então sinalizo com veemência para meu sogrão retornar para a fila, pois senão iriam achar que eu estava me aproveitando...
Mas não deu outra. Logo em seguidinha, na hora em que finalmente sou atendido, um dos aposentados, aparentemente esclarecido, sem entender a razão de eu estar ali, começa a criticar. E em alto e bom som!
Eu aponto para meu sogro e este retorna ligeirinho e retruca tentando justificar nossa presença naquela fila:
- Epa, eu é que vou pagar a conta!
Mas o aposentado, e não tiro sua razão, continua no ataque:
- Olha só a 'ceninha'. É… que do jeito que os fatos ocorreram, aparentou realmente que eu tava dando uma de gaiato.
E assim, um pequeno barraco se armou.
Meu sogro, já irritado com o chato, tenta responder a altura:
- Ah, se não quer se incomodar fica em casa. Vai dormir! O aposentado (como se meu sogro também não o fosse) continua. Fala das outras pessoas que estão sendo obrigadas a esperar. Fala que então vai trazer seu pai também pra pagar a conta antes etc. Provavelmente tem em mente a miríade de jovens que levam seus pais, avós e criancinhas de colo junto 'apenas para' passar na fila mais ligeiro. Este definitivamente não era o nosso caso, apesar de eu não negar que meu sogro bem podia ter esperado sentado e eu, então, ter enfrentado uma fila não preferencial.
Por fim também não me segurei. Perguntei ao indignado senhor:
- Quer dizer então que se eu tivesse um cadeirante comigo, ele também teria que esperar? (entenda-se: esperar enquanto eu esperasse em fila normal).
Nada contentava o sujeito que continuou a soltar impropérios.
De qualquer forma, o episódio foi daqueles bem desagradáveis.
Um capítulo de minha história que ficou entalado na goela. Não me deixou sossegado durante o resto da tarde.
Fiquei pensando em meu velho pai, portador de Mal de Parkinson. Dia desses levei-o para passear na nova Havan de minha cidade, que ainda não é big mas se até Havan já tem é porque vai chegar lá. Ele não fez compras. Nem pode: não tem mais condições. De qualquer forma, para ele que passa a maior parte dos dias sentado ou acamado, aquele passeio, de cadeira de rodas, foi revigorante, mas ao mesmo tempo cansativo, dadas suas condições. Será que, mesmo não sendo ele o pagador da conta, não teria, ainda assim, direito a que os que dele cuidam entrem na fila preferencial para que 'ele' não precise esperar? O atendimento preferencial se aplica somente àqueles que efetivamente estão de pé na fila ou também aos acompanhantes? Quem é o cliente, o que está na fila ou todos os que fazem a compra, consomem o produto e que se encontram no recinto no momento da compra? Ora, nem sempre um acompanhante está ali somente para receber atendimento privilegiado. Ele pode, como meu sogro, estar participando do corre-corre.
Tomemos o exemplo de uma família. Um casal, a mulher sendo gestante, e um menininho de 5 anos. Eles vão ao banco quitar a fatura de luz. A fila normal é enorme. A preferencial tem dois ou três na frente. A família andou durante a manhã inteira, a pé, comprando, pesquisando preços, pagando contas etc. São 11h30 da manhã. Todos estão cansados. Nos bancos, hoje em dia, geralmente há acentos. Assim, a mulher e o menino podem sentar e aguardar enquanto o pai entra na longa fila de espera. Mas... não teriam o direito eles de usufruir de atendimento prioritário também? Mesmo sentada, não tem esta mulher que carrega no seu ventre um novo e delicado ser tanto direito quanto qualquer aposentado que está em pé na fila? O tempo, mesmo admitindo que com mais conforto, passa mais ligeiro para os que estão sentados?
Comecei, então, a me questionar enquanto discípulo de Cristo. E só então percebi os diversos 'bigs' envolvidos: 1) minha big-estupidez de ensejar um falatório daqueles; 2) a mega-mancada do meu sogro em postar-se na fila preferencial e depois nos deixar nela, nós os jovens fortes e vigorosos que podemos esperar mais um pouquinho; 3) a hiper-grosseria do sujeito, que bem poderia ter tentado formas mais amenas de fazer sua queixa; 4) a ultra-lacuna de algumas leis que não especificam detalhes e dão margem a isso tudo; 5) e, por fim, a super-hiper-mega-ultra-sacanagem daqueles que se aproveitam, sim, e usam de qualquer artifício para ganhar tempo e que fazem, como sempre, os bons pagarem pelos maus.
Irônico. Dizem que o universo começou com o Big Bang e eu afirmo que só Deus, aquele que é maior do que tudo o que está no mundo, para ajeitar, ao cabo dos dias, essa história que nós homens tentamos complicar cada vez mais...
Dezembro de 2012