TENHO MEUS DIAS CONTADOS!

Talvez fosse mesmo até segredo, nem sei se é triste, mas tenho que revelar: Tenho os meus dias contados. Não é de hoje e pensei que fosse uma necessidade minha que eu contasse os meus dias, mas eu pesei bem os motivos. Quero contar uma história que me aconteceu no passado, há exatos 14.400 dias.

Um dia fui à feira livre, num mercado da cidade, chamado de mercado velho. Ficava a uns dois quilômetros da minha casa. Morávamos no bairro matinha, zona norte da cidade de Teresina, no Piauí. O mercado ficava no centro. Fui lá com meu irmão mais velho, Gregório e com mamãe, Maria das Dôres.

Lembro-me muito bem daquele dia. Eram dias muito quentes e por isso mamãe nos levou cedo da manhã. Fez as compras e nos mandou de volta pra casa pela Rua João Cabral, era uma reta só, uma rua de paralelepípedos e quando chegávamos à Alameda Parnaíba era só virar à esquerda andar mais duas quadras e meia e estávamos em casa.

Assim nós fizemos. Depois de atravessar uma avenida chamada de Avenida Miguel Rosa, passamos debaixo de uma ponte de metal por onde passava a linha do trem e uns vinte metros adiante, lá estava nosso tio Vicente. Em uma mão um copo de cachaça e na outra uma banda de limão. Parou-nos e brincou: “venham aqui meus sobrinhos, tomem um golinho de pinga, Deus perdoa...” Nós ficamos constrangidos e respondemos que nós não bebíamos. Tio Vicente meio sem jeito disse: “Eu sei filhos, estou só brincando!” Ele então comprou muitas balas para meu irmão e para mim, nos entregou, passou a mão em nossas cabeças e disse: “Vão com Deus.”

Tio Vicente era açougueiro, ou como dizem lá, era magarefe e ia para o seu trabalho, um quiosque lá no mercado mesmo, de onde estávamos voltando. Estava com sua bicicleta, com uma cesta de vime na garupa, faca e um instrumento de afiar a faca, que eu nunca lembro o nome.

Quando faltavam umas três quadras para chegar à nossa casa, tia Raimunda, esposa do tio Vicente estava subindo a rua e gritando desesperada, se descabelando e rasgando a roupa ela gritava: “O Vicente morreu, o Vicente morreu, o Vicente morreu!!!” Nós ficamos paralisados e dissemos a tia Raimunda, não, não, ele está lá no bar, nos deu estas balas, ia pro mercado. Tia Raimunda nos olhou... Como quem dizia, ah, se fosse verdade filhos... Mas a verdade, e, a dura realidade era mesmo a que ela gritava... “O Vicente morreu, morreu... Ah, meu Deus, o Vicente morreu, morreu, morreu.” Antes de chagar lá, desmaiou e foi socorrida, medicada e não pôde ver o marido no estado em que se encontrava morto no meio da rua.

Corremos o máximo que podíamos, éramos pequenos, pernas curtas, mas corremos pra casa, deixamos as compras e voltamos ao local onde conversamos e ganhamos aqueles gostosos bombons de tio Vicente. Para a nossa total tristeza constatamos a veracidade da notícia. Lá estava um ônibus parado mais à frente e uma multidão cercava o corpo já sem vida de tio Vicente. As pessoas sabendo do nosso parentesco se afastavam e diziam vejam, aí está seu tio. Meu irmão ao olhar saiu gritando assustado ao ver o tio Vicente... Só os pedaços no asfalto, misturado à carne de boi, que ele ia levando na cesta para o açougue.

Aconteceu que depois que nós passamos, o tio Vicente, também, depois de ter bebido seu gole de pinga, pegou a bicicleta e sem olhar, após passar por baixo da ponte metálica, foi atravessar a Avenida Miguel Rosa, não viu e um ônibus da empresa Primavera o atropelou.

Tio Vicente não foi um homem sábio. Não aprendeu a contar os seus dias e teve uma morte terrível, prematura, ou seja, abreviada.

Como eu disse, tenho os meus dias contados. Hoje são 19.032 dias já vividos! Não posso contar os que virão, não sei quantos ainda serão e mesmo assim não os vivi ainda, só posso contar os já vividos.

A bíblia nos diz claramente: “Ensina-nos, Deus, a contar os nossos dias, de tal maneira que alcancemos corações sábios.” Salmos 90:12.

Isto nos dá a real dimensão da brevidade da vida, o quanto somos frágeis e como necessitamos e dependemos da mão forte e poderosa de um Deus de graça e de misericórdia que habita o céu.

O salmista continua dizendo: “Os dias da nossa vida chegam a 25.200, e se alguns, pela sua robustez, chegam a 28.880, o orgulho deles é canseira e enfado, pois cedo se corta e vamos voando. Salmos 90:10.

Faz-nos assim refletir também nas palavras do sábio Salomão: “O temor do Senhor aumenta os dias, mas os perversos terão os anos da vida abreviados.” Provérbios 10:27. Ou seja, que os perversos ou os sem sabedoria não têm a capacidade de entender a grandeza da sua importancia no plano de Deus e, assim, não aprendem a contar os seus dias e não alcançam o coração sábio.

A sabedoria de contar os nossos dias nos diz muito sobre nosso comportamento aqui na terra. Remete-nos a uma introspecção sobre a nossa missão no planeta. O que estamos fazendo e o que queremos deixar para os próximos habitantes que também deverão saber contar os seus dias. Assim veremos que não temos tempo para as coisas negativas e fúteis desta vida e sempre que possível viver intensamente os frutos do espírito.

Na verdade, quem aprende, pelo poder do Espirito Santo, a contar os seus dias, certamente os verá se prolongando para a glória de Deus, sempre.

Pr. Camilo Martins

Aqui, hoje, 28.10.2016

10h04min [Noite]

Estilo: Artigo