O Que Trabalha Deve Ser o Primeiro a Gozar dos Frutos
Em II Timóteo 1.13, o apóstolo Paulo chama seu aluno a conservar o modelo (hypotyposin: esboço, exemplo, amostra) de sãs palavras que havia ouvido dele. Segundo Calvino, ele quer que Timóteo guarde com bastante zelo a doutrina que o apóstolo lhe havia ensinado, ensinando também da mesma forma.
Devemos encher a nossa vida, os nossos pensamentos e a nossa boca da Palavra de Deus. Para isso, precisamos estar sempre em contato com ela, lendo-a, estudando-a, e buscando reter tudo o que podemos aprender dela. Entretanto, um dos meios pelos quais o Senhor decidiu instruir a Sua Igreja foi por meio de mestres. Timóteo deveria guardar aquilo que aprendeu diretamente de Paulo, esse era o modelo que ele deveria seguir. Isso nos coloca com uma certa dívida em relação aqueles com quem aprendemos.
Essa ideia é pressuposta nos versículos seguintes, em que Paulo lamenta ter sido abandonado por "todos os que estão na Ásia", enquanto louva a Deus pela família de Onesíforo, que serviu grandemente, bem como chama Timóteo a sofrer juntamente com ele. Isso porque Paulo, como um lavrador, havia trabalhado arduamente, e merecia algum fruto do seu trabalho. A doutrina que inferimos disso é que todos temos a obrigação de recompensar, de alguma forma, aqueles que nos ensinam.
Nós manifestamos que aprendemos a Palavra de Deus vivendo "na fé e no amor que há em Cristo Jesus" (2Tm 1.13). Ora, uma das maiores manifestações de fé e de amor é a gratidão, não apenas enquanto sentimento (porque fé e amor, na Bíblia, não são meros sentimentos), mas enquanto prática real e manifesta. Aliás, se devemos demonstrar amor até para com os nossos inimigos, como podemos deixar de fazê-lo aos nossos amigos? E se devemos abençoar os que nos amaldiçoam, como podemos ignorar aqueles que nos trazem tão preciosas bençãos pela Palavra de Deus?
O "Espírito Santo que habita em nós" (2Tm 1.14) é o mesmo que habita em nossos irmãos em Cristo. Se Ele trabalha em nós, trabalha também em nossos irmãos, em especial aqueles que estão mais envolvidos com a obra de Deus aqui na Terra. Portanto, devemos nos esforçar para estar unidos em um só propósito com esses irmãos, auxiliando-os como o Espírito Santo nos auxilia.
É extremamente triste ver aqueles que se dedicam com zelo ao Reino de Deus serem abandonados por aqueles que se dizem participantes desse Reino (II Timóteo 1.15). Em muitos casos, o abandono de um líder cristão genuíno significa um abandono do próprio Cristo, uma vez que afastar-se de alguém que está próximo Dele é afastar-se Dele mesmo, tal como afastar-se de alguém cheio do Espírito Santo é afastar-se do próprio Espírito Santo. A traição é sempre lamentável, ainda mais na situação de Paulo, que estava sozinho e em perigo de vida por causa do Evangelho. Pessoas assim são verdadeiros parasitas, que estão dispostos a sugar tudo o que podem dos outros, mas não trazem proveito algum para ninguém.
O Senhor recompensa aqueles que são gratos àqueles que os abençoam. Por isso, em 2Tm 1.16-18, Paulo pede que Deus tenha misericórdia de Onesíforo e sua família. Isso se trata não apenas de recompensa no mundo porvir, mas já agora nesse mundo. Deus é "rico em misericórdia" (Ef 2.4), de modo que ele pode surpreender na sua liberalidade em nos recompensar, nos dando infinitamente mais do que tudo quanto pedimos ou pensamos, segundo o poder que JÁ opera em nós (Ef 3.20).