Espinhos camuflados
“E a Adão disse: Porquanto deste ouvido à voz de tua mulher, e comeste da árvore de que te ordenei, dizendo: Não comerás dela, maldita é a terra por causa de ti; com dor comerás dela todos os dias da tua vida. Espinhos e cardos também, te produzirá; comerás a erva do campo.” Gen 3; 17 e 18
Já discorri noutro texto chamado “Assembleia de Deus”, que, mesmo dispondo do poder absoluto, o Eterno se agrada de compartilhar coisas com homens e anjos que sejam de Sua confiança. Dos anjos, fez co-autores da criação, delegando-lhes liberdade e supervisionando o trabalho, quando, Ele “Via que era bom”.
Pois bem, por ocasião da queda, tivemos um “plus”, um acréscimo à criação derivado do juízo Divino incidindo sobre o homem; “espinhos e cardos também te produzirá...” Esse “também” permite inferir que, até então, ervas daninhas e espinhos não faziam parte da criação; seu concurso tornaria mais penoso o trabalho humano, tipificado pelo “suor do rosto”, pois, o trabalho em si é uma bênção, mas, quando árduo e pouco frutífero, não.
Não há registro que O Criador tenha supervisionado a esse “suplemento” criativo; vendo que era bom, ou, mau, afinal, foram criados como sinais de juízo, punição.
Se, é vero que “cada um dará conta de si a Deus”, como diz na epístola aos Romanos; também o é que, somos responsáveis diretos pelas coisas que estão sob nosso domínio, influência. O planeta fora entregue a Adão, com um senão, apenas, certa árvore; como desobedeceu, a sentença atingiu toda a jurisdição de seu domínio: “Maldita é a terra por causa de ti.”
Embora se trate de espinhos, literalmente, também é recorrente na Palavra de Deus a presença deles como metáfora; símbolos de mau caráter, incômodo. Na célebre parábola de Jotão, homens de bem são comparados a árvores frutíferas, e o bastardo e assassino Abimeleque é figurado como sendo um espinheiro. Ver, Juízes Cap; 9
O Salvador, por Sua vez, na Parábola do Semeador quando disse que parte da semente caíra entre espinhos explicou: “E o que foi semeado entre espinhos é o que ouve a palavra, mas os cuidados deste mundo, e a sedução das riquezas sufocam a palavra, e fica infrutífera;” Mat 13; 22
Assim, se à criação foi acrescido o concurso de espinhos como juízo Divino, ao caráter humano foi anexo uma série de desvios, invenções de sua própria mão, quando não, sugestões malignas que deturparam a original “Imagem e Semelhança” de Deus. Salomão denunciou do seu jeito. “Eis aqui, o que tão-somente achei: que Deus fez ao homem reto, porém eles buscaram muitas astúcias.” Ecl 7; 29
Desde que alijado da comunhão com o Eterno, o lapso decorrente “estimulou” muitas astúcias, inventos, simulacros, que deram azo à idolatria. A liberdade para a qual fomos criados não é irresponsável, irrestrita; antes, move-se dentro de certos parâmetros estabelecidos por Deus.
A tentativa de agradar Ao Altíssimo numa fusão de meios humanos com os Divinos equivale também a semear entre espinhos, figura que o profeta Jeremias usou: “Porque assim diz o Senhor aos homens de Judá e a Jerusalém: Preparai para vós o campo de lavoura; não semeeis entre espinhos.” Jr 4; 3
Ironicamente, quando O Senhor foi humilhado e coroado de espinhos, a figura que nos envergonha e situa era bem mais eloquente que o mero escárnio dos algozes. Aqueles espinhos dolorosamente colocados sobre a fronte de um inocente tipificavam todas as nossas maldições decorrentes do pecado repousando, sobre o Reis dos Reis, o Salvador Bendito, ainda que, não identificado assim, dada a cegueira reinante então.
Escrevendo aos Gálatas, Paulo ensinou: “Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se maldição por nós; ... Gál 3; 13 Noutras palavras, levou sobre si os espinhos de nossa deformação moral e espiritual, para, pelos seus méritos inefáveis nos regenerar à imagem inicial.
Embora muitos espinhosos da praça ainda apregoem que nosso fim é prosperar materialmente, a Bíblia insiste em desqualificar tais mensageiros, apontando para um alvo superior. O ministério do ensino deve conduzir os crentes, “até que todos cheguemos à unidade da fé, ao conhecimento do Filho de Deus, a homem perfeito, à medida da estatura completa de Cristo,” Ef 4; 13
Afinal, malgrado nossos espinhos do pretérito, o alvo agora são frutos; “eu vos nomeei para que vades e deis fruto,” Disse. Como ele mesmo ensinou seria incoerente esperar fruto de espinheiros é necessário que, antes de tudo, se transforme a natureza das árvores. Isaías vaticinou precisamente isso: “Em lugar do espinheiro crescerá a faia, e em lugar da sarça crescerá a murta;...” Is 55; 13
Em suma, “conversão” que não implica mudança radical de vida, de valores, é mera camuflagem de espinhos.