O "endereço" do mundo

“Não são do mundo, como eu do mundo não sou.” Jo 17; 16

Jesus situou os discípulos como não sendo do mundo, o que enseja algumas reflexões. O que é mundo? Eis aí uma questão cuja resposta não cabe numa sentença. O conceito é muito difuso. Pode-se ter o mundo dos esportes, das artes, da política, do cinema… Platão identificava o berço da razão pura como o Mundo das Ideias, etc.

Seja o que for que o Salvador tinha em mente, era mau aos seus olhos, entre outras coisas, por odiar quem recebera Sua Palavra. “Dei-lhes a tua palavra, e o mundo os odiou, porque não são do mundo, assim como eu não sou do mundo.” V 14

Conheci uma mentalidade evangélica extremamente simplista do quê era andar segundo o mundo. O habitat dos salvos não deveria exceder a família, trabalho e igreja; os demais ambientes, estádios, cinemas, teatros, bailes, etc. eram ambientes do mundo que deveríamos evitar. Música só evangélica, as demais são do mundo. Será que é isso?

Qualquer que seja o significado de separar-se do mundo, certamente não é geográfico por uma simples razão, seria impossível. Exceto, se Deus fizesse conosco como fez com Enoque e Elias; arrebatasse para si. Jesus deixou claro na mesma oração. “Não peço que os tires do mundo, mas que os livres do mal.” V 15

Há casos em que devemos nos separar; analisemos o salmo primeiro; “Não anda segundo o conselho dos ímpios”; isso é uma separação moral, de valores; “não se detém no caminho dos pecadores;” aí, uma profilaxia espiritual. Não fica em companhia ímpia além do necessário, circula entre os tais, mas, não se detém a ponto de fazer daquele seu ambiente; “não se assenta na roda dos escarnecedores”; aí, separação física mesmo. Mas, dum ambiente tal, que impera o escárnio, a zombaria; isso é impiedade deliberada, onde insistir em pregar seria lançar pérolas aos porcos, o que o Mestre desaconselhou.

Assim vemos que a separação do mundo preceituada é conceitual; antes, de valores que locais. Tiago equaciona a adoção de práticas mundanas pelos crentes a adultério espiritual. “Adúlteros e adúlteras, não sabeis vós que a amizade do mundo é inimizade contra Deus?” Tg 4; 4 Então, se não podemos achar uma definição satisfatória de “mundo”, temos traços de seu caráter. Inimigo de Deus.

João amplia: “Não ameis o mundo, nem o que no mundo há. Se alguém ama o mundo, o amor do Pai não está nele. Porque tudo o que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida; não é do Pai, mas, do mundo.” I Jo 2; 15 e 16 Cobiças naturais e soberba, também estão no DNA do mundo que se opõe ao Santo. Quando diz a Palavra que Deus amou o mundo ao dar Seu Filho refere-se às pessoas do sistema, não ao sistema em si.

A separação, também chamada de santificação deriva de levarmos cabalmente a sério a Palavra, o que, ainda consta na referida oração do Salvador; “Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade.” V 17 Assim, qualquer ensino que contrarie, perverta, desvirtue a Palavra de Deus, mesmo que desfile em púlpitos ou canções góspeis, é do mundo.

Aliás, um famoso hino chamado “Sabor de Mel” é cantado por muitos evangélicos sonolentos que não percebem que os valores defendidos na letra são do mundo. O triunfo na terra, o sucesso. Alguém que sofreu e triunfou e agora vais se vingar de quem o não ajudou na hora difícil; tal será ignorado pelo “vencedor.” Mais, a congregação é mera plateia, o púlpito vira palco, local de show. Não estou julgando pessoas, mas, analisando uma letra cuja inspiração, seguramente não brotou do Espírito Santo, pela contradição de coisas que esposa.

“De uma mesma boca procede bênção e maldição. Meus irmãos, não convém que isto se faça assim. Porventura deita alguma fonte de um mesmo manancial água doce e água amargosa?” Tg 3; 10 e 11 Nós incorremos nisso, mas, inspirados pelo Santo, não.

Em suma, não somos do mundo, embora, devamos amar seus habitantes e à medida do possível, iluminar. A separação das pessoas aconselhada refere-se aos crentes hipócritas. “Já por carta vos tenho escrito, que não vos associeis com os que se prostituem; isto não quer dizer absolutamente com os devassos deste mundo, ou com os avarentos, ou com os roubadores, ou com os idólatras; porque então vos seria necessário sair do mundo. Mas agora vos escrevi que não vos associeis com aquele que, dizendo-se irmão, for devasso, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com o tal nem ainda comais.” I Cor 5; 9 a 11