O amplo caminho estreito
“Porque assim vos será amplamente concedida a entrada no Reino Eterno de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo.” II Ped 1; 11
Aqui Pedro fala de acesso amplo ao Reino de Deus; todavia, o Salvador dissera que é estreito; “Entrai pela porta estreita; porque larga é a porta, e espaçoso o caminho que conduz à perdição, e muitos são os que entram por ela; porque estreita é a porta, apertado o caminho que leva à vida, poucos há que a encontrem.” Mat 7; 13 e 14
Seriam esses textos uma contradição? Num primeiro momento parece. Contudo, devemos ver melhor antes de formarmos uma opinião.
A conjunção conclusiva, “assim”, que inicia o verso aponta para trás, para algo que foi dito antes; assim como? Que ideia Pedro está concluindo?
Depois de exortar seus leitores a enriquecerem a fé com virtude, ciência, temperança, paciência, piedade, amor fraterno, caridade, explicou: “Porque, se em vós houver e abundarem estas coisas, não vos deixarão ociosos nem estéreis no conhecimento de nosso Senhor Jesus Cristo. Pois aquele em quem não há estas coisas é cego, nada vendo ao longe, havendo-se esquecido da purificação dos seus antigos pecados. Portanto, irmãos, procurai fazer cada vez mais firme a vossa vocação e eleição; porque, fazendo isto, nunca jamais tropeçareis.” Vs 8 a 10
Só depois desse receituário de valores cristãos, concluiu que seria concedida uma entrada ampla aos que isso fizessem.
Estreitamento é uma limitação derivada de fatores internos, nossos valores, escrúpulos, paixões, ou, externos; pelo temor da reação da plateia, se, contrariarmos suas inclinações ou expectativas em relação a nós. A mistura de crentes e descrentes no cenário de Corinto, por exemplo, ensejou alguns conflitos éticos que Paulo ao saber tratou de diagnosticar a causa; “Ó coríntios, a nossa boca está aberta para vós, o nosso coração dilatado. Não estais estreitados em nós; mas estais estreitados nos vossos próprios afetos.” II Cor 6; 11 e 12 Vemos aqui um estreitamento que não conduzia à salvação, mas dificultava o curso na vereda dessa.
Alguns estavam tentando conciliar os novos valores em Cristo com os de familiares não convertidos o que os estava limitando.
De certo modo, Paulo receitou um alargamento via assepsia espiritual. “Não vos prendais a um jugo desigual com os infiéis...” II Cor 6;14 Assim como o amor sem contexto é algo neutro, se pode amar as trevas ou a luz, de igual modo, o estreitamento pode ser virtuoso, a cruz, ou apenas nocivo como no caso em apreço. Por isso Pedro pontuou: “Assim ...” daquele modo, o caminho dos salvos se ampliaria.
Quando Cristo aludiu que a porta é estreita falava primeiro de si, cujo limite intransponível era a vontade do Pai. “E aquele que me enviou está comigo. O Pai não me tem deixado só, porque eu faço sempre o que lhe agrada.” Jo 8; 29 E a coisa se nos estende uma vez que nosso desafio é imitá-lO.
Tal estreitamento se verifica em nossa caminhada por causa das más inclinações que nos habitam e devemos crucificar; “Porque a inclinação da carne é morte; mas a inclinação do Espírito, vida e paz. Porquanto a inclinação da carne é inimizade contra Deus, pois não é sujeita à lei de Deus, nem, em verdade, pode ser.” Rom 8; 6 e 7
Aquelas virtudes alistadas por Pedro não derivam de nossa veia natural, pois; antes, do Espírito Santo atuando em nós. Então é estreita a porta, apertado o caminho, pois, leva à negação da natureza, à cruz; todavia, o aperfeiçoamento via obediência enseja santificação, “naturalidade” na prática dos bons hábitos, aperfeiçoamento e discernimento. “Mas o mantimento sólido é para os perfeitos, os quais, em razão do costume, têm os sentidos exercitados para discernir tanto o bem quanto o mal.” Heb 5; 14
Assim, Cristo fala de estreitamento prevendo óbices na caminhada; Pedro de amplitude no sentido de certeza da vitória, convicção, aos que forem fiéis nos dias difíceis. Como uma rodovia bem sinalizada para orientar transeuntes e facilitar o percurso, também a vereda da Salvação. Obedecermos a toda a sinalização é nosso estreitamento; feito isso, a chegada à Cidade Santa é certa.
Para quem dá os primeiros passos na fé, parece que os preceitos do Eterno são muito difíceis de cumprir; a outrem que já atingiu a maturidade espiritual, nada mais o assusta, sequer, a morte, como asseverou Paulo. “Porque para mim o viver é Cristo, e o morrer é ganho.” Fp 1; 21 O que o poderia estreitar agora?
Por que, quem consegue enxergar o além com tal convicção, não pode mais ser detido por estreitamento nenhum. Purgou seus maus hábitos no caminho estreito, e chegou vencedor, na posse de uma certeza inabalável, ampla.