ABORTO A PIOR DAS MALDADES!

Minha idade nem lembro mais, uns vinte anos talvez,
passando por uma rua, manhã cedinho, perto a um barranco,
avistei aquela menina de uns cinco anos, vestido todo sujo de lama, brincando na chuva, rolando na grama.

Sem explicação alguma, senti vontade de juntar-me a ela e simulando um escorregão, fui rolando até chegar ao seu lado. Mesmo toda suja de terra impressionou-me a beleza, a risada melodiosa de quando me viu fingindo estar assustado. Subitamente parou de rir, para abrir o sorriso mais terno que meus olhos haviam avistado, deslizou suas mãozinhas pela minha cabeça, levantou-se saiu correndo sem olhar para trás, até que  meus olhos a perderam.

Sempre que passava naquele lugar, alguma coisa, fazia com que  olhasse para baixo, a procura daquela linda menina, impressionou-me tanto, que nem sabendo o porque, tentei encontrá-la pelas ruas do bairro. Mas, ninguém fora capaz de identificá-la.

Os anos foram se passando, quase cinqüenta anos depois, eu já com meus sessenta e nove anos, diga-se de passagem, muito bem vividos, comerciante bem sucedido, casado, pai de três lindos filhos, de repente sem razão alguma aparente, comecei sentir-me triste, deprimido e por ordem médica, fazia caminhadas matinais, quando num dia de chuva fina, passando pelo mesmo barranco, olhei para baixo, escorreguei, desequilibrando-me, fui rolando, caindo, batendo a cabeça numa pedra, ficando por uns instantes desfalecido.

Ao abrir os olhos, lá estava a menina, desta vez, não ouvia sua risada, mas, mostrava um sorriso terno, um olhar sereno na sua face tão bela. Parecia que para ela, o tempo não havia passado. Com a voz muito fraca perguntei:Quem é você, menina bonita?

Meio a uma imagem embaçada, pude ver uma lágrima caindo, vindo em minha direção, na voz trêmula, ouvi dos seus pequenos lábios: Papai... eu sou a filha que o senhor, não deixou nascer, pediu para a mamãe, tirar-me de dentro dela. Disse pra ela, que aquela ainda não seria a hora certa, porque vocês ainda não eram casados.

Lembra papai, uma vez chamei sua atenção aqui neste mesmo lugar, queria que me conhecesse, queria que sentisse como eu gostaria de ter sido criança, brincar com a mamãe, meus irmãos, mas, foi de você papai, de quem mais senti falta, do seu colo, do seu abraço!

Hoje estou aqui para finalmente abraçá-lo, atravessar contigo o túnel da eternidade, o mesmo túnel papai, que um dia ainda bebe, chorando de medo e sem entender o porque...atravessei sozinha!
Paulo Cesar Coelho
Enviado por Paulo Cesar Coelho em 11/05/2007
Reeditado em 11/05/2007
Código do texto: T483270
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